quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

REMINISCÊNCIAS

Caramba! Estou ficando maduro! Eu disse cronologicamente maduro, não desatualizado, antes que alguém me venha com essa! Percorri um longo e gostoso caminho até aqui nestes 42 anos de profissão, foi um longo e detalhado aprendizado, todos os dias. Olhando bem até, tenho a convicção de que contribui de diferentes formas para a evolução deste ramo de conhecimento do controle de pragas e ainda tenho um punhado de idéias que precisariam ser testadas. Com prazer leio e escuto falar sobre os novos avanços tecnológicos e novas pesquisas. Em um desses momentos, conversava por internet com uma amiga bióloga dessa “velha guarda” quando ela citou a Pasta Zélio, um antigo raticida da Bayer muito popular há décadas atrás, desbancada pelo surgimento das 4-hidroxicumarinas. A partir daí, entre risadas eletrônicas, começamos a lembrar alguns produtos que existiam no arsenal do combate às pragas em nosso país e que fizeram parte do nosso cotidiano daqueles tempos. Especialmente para os mais jovens, mas também para delícia dos “old timers”, resolvi montar um post falando daqueles produtos antigos que tão bons serviços nos prestaram.
A chamada “revolução industrial”, iniciada por volta do ano 1800, possibilitou incríveis avanços tecnológicos a partir da produção em massa de uma série infindável de produtos. A indústria química ganhou especial atenção no campo fabril. A obtenção de matérias primas sintéticas a partir dos subprodutos do carvão, nitrogênio e fosfatos fez crescer as possibilidades de múltiplos e novos usos. Entrava-se no século XX com a visão de universo totalmente transformada pelas possibilidades que se apresentavam pelo avanço tecnológico. A química era tida como uma ciência que transpunha todos os problemas do mundo moderno. Neste ambiente de desenvolvimento industrial, principalmente nas suas últimas décadas, houve um crescimento desenfreado e desmedido na utilização de produtos químicos pelo homem, por conta dos benefícios que se pretendiam obter com os mesmos, algumas vezes acarretando prejuízos tanto ao meio ambiente como à sua própria saúde e que se faz sentir até os dias atuais. A propaganda, seja em cartazes, seja em anúncios e cartões-postais, tinha papel primordial nesse contexto. De modo geral, os produtos procuravam conquistar o consumidor, especialmente aqueles que nunca tinham tido a possibilidade de desfrutar de um padrão de vida melhor: cura de doenças, controle de pragas (especialmente insetos e ratos), limpeza mais eficiente, menos esforço nos afazeres domésticos... A grosso modo, podem ser distinguidos dois tipos de propaganda: a que valorizava a eficácia frente a uma determinada situação, até mesmo exacerbando suas qualidades, com omissão aos perigos do uso indevido ou de manipulação por pessoas inabilitadas (crianças, principalmente) e a que mostrava as virtudes do produto por meio de uma história fictícia que envolvia e convencia o consumidor a adquirir o mesmo. A sedução era o “segredo” para conquistar novos consumidores, com “boas doses de exagero” prometendo, muitas vezes, confortos e regalias que não se verificavam com o tempo. Existiram também propagandas curiosas de produtos que passavam a idéia de que a Química tinha o poder de criar produtos inesgotáveis, no caso, uma falsa qualidade do produto, como atesta o trecho a seguir: “os melhores banhos são os de cascatas onde a água nunca se acaba... e os banhos mais deliciosos são tomados com o sabonete Vale Quanto Peza, o sabonete que também nunca se acaba”.
Já que falamos, vamos começar pela velha Pasta Zélio (nunca descobri a razão desse nome) cujo ingrediente ativo era o sulfato de tálio, que era fabricada e distribuída pela Bayer lá pelas décadas de 40 e 50. Soube que a Pasta Zélio era formulada como uma pasta verde (para se colocar em algum alimento apetecível pelos ratos) e em grânulos (isca).
Peguei o finalzinho da comercialização desse produto, porque a própria Bayer o descontinuou quando lançou seu raticida Racumin na década de 50 no Brasil, um hidroxicumarínico bem mais seguro que o sulfato de tálio. Soube que no México, a Pasta Zélio ainda é comercializada, não sei por qual empresa fabricante.
Outro produto bem conhecido desde tempos idos é o ácido bórico (ou bórax), disponível em cristais incolores ou sob a forma de pó branco. Eclético, o ácido bórico era usado como inseticida, como antissético em pequenas feridas ou queimaduras, como adubo e até como reatardante de chamas. Como inseticida atuava na forma de pó contra pulgas e cupins; misturado com algum atrativo, como o açúcar de confeiteiro, era ótimo contra formigas doceiras e baratas. Relativamente pouco tóxico, pouco mais que o sal de cozinha (DL50 de 2.660mg/kg) era largamente utilizado nos ambientes domésticos. Lembro-me de uma propaganda veiculada via rádio que dizia (com voz de japonês): “Massinha miragrosa, mata as balatas de sua casa”. Vendia muito, antes do surgimento das pastas e géis baraticidas à base de hidrametilnona e fipronil.
E quem se lembra do Neocid? Era uma pequena lata que continha um pó branco; a lata era fechada e continha um orifício lateral recoberto por um selo colado. Bastava remover o selo e prmer a lata no ponto indicado e saia um borrifo de pó. Pertencia à Ciba-Geigy e o i.a. era o DDVP. Existe ainda hoje e seu descendente atual é o Neocid Mortein pó contra formigas e pulgas (da Reckit Beckinser), à base de carbaril (um carbamato). O velho Neocid era muito utilizado pelas mamães para eliminar piolhos da cabeça de seus pimpolhos. Polvilhava os cabelos, punha um pano envolvendo a cabeça e aí o deixava por uma hora; removia o pano e todos os piolhos estava mortinhos da silva! Depois era só passar um pente bem fino (qualquer farmácia o vendia) para remover a lêndeas (ovos). Grande Neocid. Nunca ouvi falar que alguma pessoa tivesse se intoxicado com ele! Injustiçado, como o velho DDT.
Outro velhinho é o Verde de Paris, o nome popular de um composto descoberto em 1808, o Aceto Arsenito de Cobre, um pó de cor verde intenso que começou a ser comercializado em 1814, não como praguicida, mas sim como um mero pigmento para tintas; em 1814 descobriu-se que as tintas que levavam esse composto eram tóxicas e muitos pintores foram envenenados por esse pigmento sendo ele completamente banido das tintas. Apenas em 1867 o Verde de Paris foi introduzido no combate a pragas, inicialmente utilizado o escaravelho da batata. Em 1900 era usado em tão larga escala que levou o governo dos Estados Unidos da América a estabelecer a primeira legislação no país sobre o uso de insecticidas e o heróico verde de Paris foi proscrito.
Quem ainda se lembra do Detefon? Quero dizer, o antigo, porque ele ainda está à venda nos supermercados e assemelhados (é da Reckit Benckiser). Falo daquele que vinha em latinhas de 500 ml e que precisava de uma bomba manual para ser aplicado. Falo daquele cuja propaganda dizia que ele era eficaz contra mosquitos (pernilongos) da malária, da febre amarela, do tifo, das baratas e pulgas, pois ele era o anunciado “mata tudo”, expressão que só foi proibida pela Anvisa em 1997. O primeiro fabricante foi o Laboratório Fontoura e, depois, a Anakol comprou seus direitos; tornou-se extremamente popular na década de 50 devido seus ótimos resultados. Detefon continha DDT (por isso é que matava tudo mesmo) até a proibição desse organoclorado.
Falando em Detefon, me lembrei do FLIT, lançado para uso doméstico em 1923. Tratava-se de um óleo mineral, derivado do petróleo, indicado para combater mosquitos ao ser aplicado através de uma bomba manual tão popular que podia ser encontrada em qualquer biboca que se prezasse. A propaganda do Flit no Brasil usava o mesmo soldadinho de túnica vermelha empunhando a bomba do produto.
Lá na gaveta das lembranças primevas, ainda tem outros produtos como o Neguvon e outros. Mas isso vai ficar para outra vez.

sábado, 10 de dezembro de 2011

POSSÍVEIS NOVOS BIOINSETICIDAS

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A Internet abriu um mundo fantástico diante de nossos olhos (e cérebros). Aquele que se dispuser a navegar em busca livre de alguma informação, vai se surpreender com a imensa quantidade disponível de sites, blogs, citações, livros, artigos publicados e assemelhados que podem ser consultados ao alcance de um clique em seu computador. Outro dia, busquei uma informação em que estava interessado e o Google me informou que havia mais de 15.000 locais onde a informação desejada poderia ser acessada! Nem que eu fosse mágico conseguiria consultar todas as fontes localizadas, por isso me limitei a acessar duas ou três e já me dei por satisfeito.
Em um desses passeios livres, encontrei um artigo que me interessou. O autor falava de algumas pesquisas e certas descobertas que poderiam ser promissoras na busca de novos biocidas. Achei que os leitores do Higiene Atual poderiam se intressar por esse tema, juntei mais alguma coisa que já havia buscado e escrevi este post.
O autor (John Brown) começa afirmando que o homem nunca sintetizou um inseticida cujo mecanismo de ação não ocorresse na Natureza. A maioria dos inseticidas sintéticos tem modo de ação similar a aqueles que ocorrem em plantas, animais, minerais ou micróbios. Certas espécies de crisântemos (flores) produzem defesas contra herbívoros (piretrinas). A criolita é um mineral que apresenta propriedades inseticidas. A delta-endotoxina do micróbio Bacillus thuringiensis faz com que insetos parem de se alimentar. O cartape é um exemplo de uma secreção defensiva animal que apresenta propriedades inseticidas. Certos inseticidas sintéticos podem ser modelados a partir de alguns hormônios naturais de insetos (reguladores do crescimento de insetos – IGR). Portanto, não é de admirar que certos enzimas encontrados nos insetos, como as quitinases, estejam sendo estudadas como possíveis inseticidas.
Achei isso muito interessante! As quitinases são enzimas que degradam a quitina (proteína) que recobre o exoesqueleto dos insetos, mas tamb´[em estão presentes no mundo vegetal. Trata-se de um polímero formado por longas cadeias repetidas de açúcar constituindo complexas moléculas. Certas plantas desenvolveram quitinase para se defenderem do ataque de fungos, mas também podem atuar na resistência contra insetos. Por exemplo, sementes de cereais contêm substanciais quantidades de quitinases (0,01%); essa quantidade podem defender a semente do ataque de fungos, mas claramente é insuficiente para evitar o ataque de insetos nos grãos armazenados. As quitinases vegetais podem atacar a membrana quitinosa do esôfago do inseto, bem mais fina que sua quitina da carapaça. Essa membrana tem no máximo 12% de quitina e um ataque enzimático poderia resultar em severa abrasão que provocaria no inseto imediata cessação da capacidade de se alimentar. Pesquisadores envolvidos na busca de novos inseticidas, têm se voltado ao estudo das quitinases. Os Drs.Kramer e Muthukrishnan da Universidade de Kansas publicaram interessante trabalho nesse estudo (biologia molecular) onde estudavam diferentes quitinases de diferentes origens e o código do DNA de certas quitinases foram clonados e inseridos em plantas. Essas plantas transgênicas são então criadas com tecnologia similar à da criação das plantas já disponíveis no mercado que contêm o gene da delta-endotoxina (do Bacillus thuringiensis). As quitinases podem aumentar o efeito da delta-endotoxina, porque atacam o trato digestivo de insetos, aumentando o efeito da delta-endotoxina.
Portanto, no futuro, poderemos ter quitinase como aditivo da delta-endotoxina no produto à base de B.thuringiensis que hoje compramos, por exemplo, resultando em efeito altamente potencializado. A pesquisa não para, amigos!

domingo, 20 de novembro de 2011

MELHORANDO O DESEMPENHO DE SUA EMPRESA


OK! Sua empresa controladora de pragas é pequena, você e mais meia dúzia de pessoas trabalhando duro para fazê-la crescer, de vez em quando um mês muito fraco e dificuldades para pagar todas as obrigações financeiras, fiscais e cobrir a folha de pagamento. Não é fácil, eu sei. Uma pasta de clientes não muito grande necessitando fortemente de algum crescimento que a fortaleça, o mercado povoado por empresas controladoras de todos os tamanhos e portes competindo por conquistar centímetros. O que fazer?
Bem, muita coisa! Se a empresa é de pequeno porte, o campo de possíveis melhorias pode ser vasto. Começando por dentro da própria empresa: administração mais descomplicada. Não estou dizendo mais simplificada ou mais superficial; estou querendo dizer através de métodos mais objetivos como, por exemplo, compra de materiais e insumos. Além de organizar um almoxarifado (por menor que seja) bem controlado onde tudo o que entra e que sai é devidamente assentado em programinhas de controle, é preciso centralizar as ações administrativas em uma só pessoa, de preferência em um funcionário de confiança. Em tempo, o proprietário da empresa deve reter o controle financeiro e a orquestração geral, mas deve reservar grande parte de seu tempo para a conquista de novas contas, gerenciamento das já existentes e, especialmente, o pós venda. Não ter controles achando que são desnecessários porque a empresa é pequena, é o caminho mais curto para o brejo, onde certamente a vaca vai se atolar! Outra coisa, o imediatismo: por menor que seja a empresa, esse negócio de ir ao distribuidor para comprar dois ou três litros do inseticida escolhido, o necessário para executar um ou dois serviços, é totalmente contraproducente. A empresa certamente vai pagar o preço cheio no balcão e isso contribuirá para diminuir sua margem de lucro. Se você computar na coluna das perdas (isso deve ser feito sempre) as despesas de muitas idas e vindas do comprador ao distribuidor e do veículo de seu transporte, vai deparar-se com valores que poderiam ajudar muito no balanço mensal da empresa.É preciso juntar um pequeno capital de giro que permita à empresa adquirir um volume maior de insumos a cada vez, adquirindo assim maior poder de negociação com seu distribuidor. Não tema, os distribuidores têm margens que permitem oferecer um desconto significativo até para as pequenas empresas, caso ela compre um volume maior de insumos. Melhores preços de compra impactam positivamente o balancete mensal, sem dúvida. Isso tudo, para não falar na parte técnica da empresa, dos serviços, onde dezenas de melhorias podem ser implementadas, tenho a certeza.
Muito bem. Mas, e se a empresa já for de média para grande, onde dezenas de funcionários administrativos e operacionais trabalham e a carteira de clientes e contratos permanentes já é razoavelmente (ou muito bem) recheada. Se você já tem pessoal especializado nos diferentes setores da empresa, equipes de serviço, veículos e clientes, o que a empresa pode fazer para subir um degrau no mercado, crescer para um patamar superior, alavancar seus negócios? Obviamente suas preocupações já são de outra sorte do que aquelas experimentadas por uma pequena empresa controladora. Quando todas as medidas administrativas e técnicas já foram implementadas na empresa (aliás, por isso ela cresceu), pode parecer mais complicado e difícil dar o empurrão que a impulsionaria a partir do ponto em que se encontra. Outros tipos de barreiras devem ser buscadas e equacionadas, começando por melhor conhecer as necessidades de sua clientela. O caminho para o crescimento passa também por incluir equipamentos mais modernos (melhorar custo/benefício), aperfeiçoar o treinamento do pessoal (administrativo e operacional), adequar metas e expectativas, melhorar a comunicação, a visibilidade e a transparência da empresa. Se já tenho bons profissionais operacionais, um bom gerenciamento e uma boa base de clientes, possivelmente minha empresa já esteja operando com boa margem de lucro, preciso visualizar o que posso fazer para desenvolver mais minhas operações no mercado.
Três coisas podem ser mencionadas:
a) Adotar equipamentos cibernéticos que possam melhorar o desempenho da empresa. Obviamente já nem mencionarei computadores de serviço, pois isso já é de uso corrente em qualquer empresa que se preze. Equipes que ainda usam papéis a serem preenchidos antes, durante e após os serviços, passam uma imagem de empresa defasada e obsoleta. Equipá-las com GPS, celulares tipo smartphones, Bluetooth, computadores tabletes (tipo Ipad)e laptops (lamento, mas esses nomes em inglês são universais e praticamente não têm tradução para o português), podem fazer enorme diferença agilizando as operações de campo, além de passar uma imagem de modernidade e presteza aos olhos do cliente. Além disso, esses equipamentos colocam as equipes em contato permanente com a sede da empresa (on line).
b) Falta de integração entre os setores de venda e operacional. Nas empresas de maior porte, é comum o divórcio entre esses dois (importantes) setores. O pessoal de vendas acha que o pessoal operacional deve estar a seu serviço e o pessoal operacional acredita que o pessoal de vendas está distante da realidade dos serviços. A verdade é que algumas das melhores oportunidades de negócios são identificadas pelo pessoal operacional à medida que interage com os clientes. Ambos os grupos precisam ser devidamente esclarecidos sobre a importância de sua integração. A saúde da empresa exige que se entendam e respeitem seus limites.
c) Treinar, treinar e retreinar. Como anda o treinamento de seus funcionários? Todos entendem perfeitamente o que a empresa quer, onde quer chegar, quais as linhas mestras de conduta esperadas dos diferentes funcionários, quais as metas mensais, semestrais e anuais estabelecidas e outras? Ou essa área anda meio frouxa?
Quer dizer, há muita coisa que pode e deve ser feita para desestagnar uma empresa de porte grande. Muita coisa!

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

DDT, O HERÓI PROSCRITO


Nenhum inseticida foi mais famoso do que o conhecido DDT. Tido e havido como o salvador da pátria, acabou execrado e foi parar no limbo do esquecimento. Tão importante foi que, em nosso país, acabou denominando a profissão do atual controlador de pragas que, ainda hoje, segue sendo chamado pelo povo de “dedetizador” e as empresas do ramo de “dedetizadoras”. Faz tempo que quero contar um pouco sobre a saga desse incrível composto chamado DDT.
O DDT (dicloro-difenil-tricloroetano), considerado o avô de todos os inseticidas modernos, foi sintetizado como um composto em 1873 na Alemanha, mas ficou esquecido em alguma gaveta porque ninguém sabia para que ele poderia servir. Foi só em 1939, ou seja, 53 anos depois, que um químico suíço, Dr. Paul Muller, trabalhando para a Geigy Química, um laboratório também suíço, descobriu, quase que por acaso, que esse composto matava insetos e bem! Foi rapidamente testado contra várias espécies de insetos e era tiro e queda! Mas, somente em 1944 é que ganhou incrível notoriedade de “inseticida milagroso” quando foi empregado com muito sucesso em campanha de saúde pública para debelar uma epidemia de tifo na cidade de Nápoles (Itália), sendo usado largamente na forma de pó para combater os piolhos disseminadores dessa doença. Depois da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), o tifo havia matado mais de três milhões de pessoas na Rússia e Europa oriental. O emprego do DDT em saúde pública foi tão bem sucedido que o Dr. Muller foi agraciado com o prêmio Nobel para medicina em 1948. Nessas campanhas contra o tifo, o DDT pó foi aplicado na cabeça e no corpo de milhares de soldados, refugiados, civis e prisioneiros, sem exibir nenhuma reação adversa. Ganhou a reputação de seguro para ser usado. A agricultura logo se interessou pelo composto porque era substancialmente barato e seu efeito era múltiplo combatendo eficazmente inúmeras pragas da lavoura; os agricultores abandonaram a rotação de lavouras em troca do tratamento químico com o DDT. Na esteira de seu sucesso vieram rapidamente outros inseticidas hidrocarbonetos clorados (mesmo grupo químico do DDT) em sucessão, tais como o BHC, o clordane, o lindane, etc, e o uso de inseticidas sintéticos se disseminou por todo o mundo. Claro que usaram e abusaram do emprego desses compostos. Imaginem que até uma velha profissão passou a ter êxito com resultados muito bons ao usar o DDT e seus análogos, a profissão do controlador de pragas urbanas, firmando-se no cenário.
A primeira onda de crítica pública ao DDT começou em 1949 quando o jornal New York Post começou a publicar uma série de artigos de autoria de Albert Deutsch, entitulada “O DDT e você”. Ele criticava o uso excessivo e abusivo do DDT e o acusava de ser o causador do “Vírus X”, uma doença que se alegava ser provocada pela exposição ao DDT. O jornalista dizia que, embora reconhecesse a utilidade do DDT quando adequadamente empregado em indivíduos, o composto era perigoso demais para o ser humano quando empregado repetidamente em campanhas de saúde pública. Até então, os riscos ou não do DDT eram discutidos somente em meios acadêmicos e entre cientistas, entomologistas e biologistas. Mas, em 1962, Rachel Carson, uma talentosa escritora, publicou um livro entitulado Primavera Silenciosa (Silent Spring) que se tornou um “best seller” na época e que despertou a atenção da mídia para o novo tema. Rachel não era cientista, mas recebeu muitas contribuições de fontes não científicas e dados algo duvidosos e imprecisos sobre os “malefícios” do DDT. Ela batia forte contra o uso abusivo dos pesticidas e pedia mais controle no seu uso. Atacava o comportamento irresponsável da sociedade tecnológica e industrializada com relação ao mundo natural. A principal acusação de Rachel ao DDT era que ele seria carcinogênico. Todavia, Rachel em nenhum momento mencionava os enormes benefícios que o DDT e outros compostos haviam trazido para a humanidade. Só como exemplo, ela relacionava doenças potencialmente perigosas para o ser humano tais como o tifo, a malária e a peste bubônica como tendo sido controladas apenas com medidas de melhoria, de sanidade do meio ambiente e de novas drogas no tratamento. Em nenhum momento mencionava que inúmeras doenças transmitidas por insetos ou roedores puderam ser atacadas com o uso de inseticidas como o DDT e outros. Quer dizer, embora o DDT não fosse o vilão da história, passou a acusado de ser. A mídia se encarregou de disseminar esse injusto papel, manipulando a opinião pública nunca devidamente esclarecida, de tal sorte que em 1972 o uso do DDT foi proibido inicialmente nos Estados Unidos e rapidamente em outros países mundo afora. Muitos outros argumentos foram então levantados contra o indefeso DDT: residual longo demais, poluição ambiental, inespecífico e uma série de outros argumentos, alguns válidos, outros exagerados. Não me lembro de ter lido nada sobre o ângulo custo/benefício do DDT. Que pena!
Em 1989, o jornal New York Times publicou a seguinte manchete: “Estudos demonstram que não há ligação entre a exposição ao DDT e o risco de contrair câncer”. Ao menos a verdade foi restabelecida, mas infelizmente, tarde demais para salvar milhões de vidas que morreram porque inúmeros programas de controle foram cancelados, especialmente em países mais pobres que jamais puderam fazer uso de outros compostos notoriamente bem mais caros!
Pensem a respeito.

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

QUIMIOFOBIA (MEDO DE PRODUTOS QUÍMICOS)


Nossa sociedade vive com uma série infindável de receios e medos. Muitos são infundados, mas outros são verdadeiros e manifestam-se intensamente em determinadas pessoas. O desejo de não ter que conviver com insetos, ratos e outros bichos, leva muitas pessoas a buscar o auxílio de um profissional controlador de pragas, mas quando este se apresenta, paradoxalmente essa pessoa não quer que esse especialista faça uso de produtos químicos para solucionar o problema. Os avanços tecnológicos no controle de pragas já permitem que consigamos bons resultados no controle de algumas delas sem lançar mão de produtos químicos, mas outras não. De qualquer forma, vamos dar um passeio sobre essa delicada questão que o profissional controlador de pragas pode encontrar (com certa freqüência) no seu dia a dia.
Podemos dividir as fobias, a grosso modo, em duas grandes categorias. Cerca de 60% das fobias refletem medos generalizados. Por exemplo: agorafóbicos são pessoas que têm medo de se expor em espaços abertos, públicos ou com multidão; também receiam caminhar sozinhos ou usar transportes públicos. Seu inverso é o claustrofóbico que simplesmente não consegue permanecer em espaços fechados como um elevador ou a cabine de um avião; entrar em um tubo de tomografia, nem pensar, só sedado! O outro grupo de fobias é formado pelas fobias monossintomáticas, ou seja, a pessoa tem medo de certa coisa específica. Um bom exemplo são os musofóbicos, pessoas que têm medo de roedores em geral, os aracnofóbicos (medo de aranhas), os entomofóbicos (medo de insetos) e assim por diante. A quimiofobia (medo de produtos químicos) não se enquadra em nenhuma dessas duas categorias clínicas citadas; é mais um termo político do que psicológico. As fobias verdadeiras são manifestações individuais, enquanto que a quimiofobia traduz um comportamento coletivo vago e impreciso, sem limites plenamente estabelecidos. A quimiofobia frequentemente é inspirada por grupos ou associações de pessoas que levantam a bandeira de que qualquer produto químico é perigoso e põe em risco a integridade física das pessoas, o que está rigorosamente longe de ser verdade. Se fôssemos banir total e completamente de nossos meios ambientes os produtos químicos que nos cercam e dos quais fazemos uso cotidiano, a vida iria se tornar bem difícil, bem difícil mesmo! Se eu não usasse mais uma pasta dentifrícia, um sabão para lavar as mãos ou minhas roupas, um desinfetante na limpeza da casa e outros produtos químicos que fazem parte do meu cotidiano, creio que a vida seria bem mais complicada, cidadão urbano que sou.
Os profissionais controladores de pragas são particularmente expostos aos quimiófobos. Lidando essencialmente com biocidas, frequentemente são alvos dessas pessoas que, de forma vaga, se declaram contra produtos químicos. “- Meu apartamento está cheio de baratas e preciso que o senhor acabe com elas, mas sem usar produtos químicos”. E arrematam: “- é que eu sou alérgico”. Provavelmente não sabem que as baratas são responsáveis por crises alérgicas, bem mais que alguns inseticidas. Contudo, o que se percebe é uma tendência crescente à quimiofobia na sociedade moderna e cada vez mais o profissional controlador de pragas vai cruzar com pessoas que manifestam forte receio ou desaprovam o uso de biocidas. Com freqüência um conflito de interesses se manifesta quando uma empresa busca solução profissional para controlar insetos, por exemplo, e dentro dessa empresa existe um ou mais quimiófobos. Essa situação vai exigir muita diplomacia e tato para ser equacionada, sem dúvida!
As raízes da quimiofobia estão na sensação atávica de que “eu devo proteger a mim mesmo e minha família dos perigos”. Os produtos químicos são, de forma generalizada, catalogados como um desses perigos. O problema é que esse medo pode ganhar proporções exageradas, especialmente quando a mídia veicula acidentes intoxicativos com produtos químicos, especialmente ligados a alimentos. O célebre Paracelso (1493 – 1541), em priscas eras, já dizia que todas as substâncias podem ser tóxicas... dependendo da dose! A desinformação ou a falta de, leva a crenças infundadas. Quando um noticiário anuncia que foi encontrada a presença de traços de tricloroetileno na água de bebida da cidade, o cidadão comum se assusta porque não sabe o que é tricloroetileno, nem lê “traços” (partes por bilhão) e já fica achando que aquela água está contaminada irremediavelmente. “Traços” passa a ser “contaminação”. Esse mesmo cidadão também não sabe que na farinha de trigo que ele usa para se alimentar e aos seus, existem pelos de roedores e partes de insetos em quantidade considerada “aceitável” por lei! O cidadão comum considera que a poluição ambiental, algo que ele pouco pode fazer para resolver, representa uma ameaça à saúde pública bem maior do que todos aqueles fatores essencialmente sob seu controle, tais como fumar, ingerir álcool, dietas e estresse. Portanto, não é de se estranhar que controladores de pragas e outros grupos que se utilizam de produtos químicos sejam alvos constantes dos quimiófobos e da mídia.
Dessa forma, o público não está reagindo a riscos reais, mas à sensação de risco, a riscos percebidos. Percepção não é realidade. Realidade é realidade! Na prática, então, o profissional controlador de pragas está lidando muito mais com risco percebido do que propriamente um risco real e pouco adianta discursar para tentar esclarecer e reduzir as sensações a suas verdadeiras dimensões. Um discurso tecnificado, cheio de palavras e dados técnicos, só tende a piorar as coisas, pois o cidadão comum (que não tem o conhecimento técnico do profissional) vai achar que está sendo “enrolado”. A melhor postura é a não discussão, deixando isso para os acadêmicos e estudiosos de plantão. A busca de alternativas é a chave para contornar tais situações. Os controladores de pragas precisam promover a ideia de que estão sempre preocupados com as pessoas e que são parte da solução, muito mais do que parte do problema. Essa deveria ser a bandeira individual de cada profissional controlador de pragas e das associações que os representam.

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

O QUE HÁ DE NOVO POR AÍ?


Foi a pergunta que recebi de nosso leitor Hipólito. Ele queria saber se há alguma molécula nova sendo registrada em produto comercial (domissanitário) e quem a estaria registrando. Bem, amigo Hipólito, não sou exatamente o que se chama de “insider” da Anvisa e só fico sabendo das coisas que lá acontecem (de nosso interesse) quando eles abrem a informação para o público em geral, através de uma consulta pública, por exemplo. Dessa forma, sei bem pouco sobre intenções de lançamento no mercado nacional, mas sei que tais lançamentos de moléculas novas são mais ou menos raros. Contudo, vamos dar uma espiadela naquilo que já vazou e que talvez nem lhe seja novidade!
Para começar, vamos lembrar que novas moléculas inseticidas geralmente surgem primeiramente no mercado agrícola e só depois são estudadas como domissanitários. Fácil de entender: o uso agrícola (agricultura e/ou pecuária) é vastamente superior ao mercado urbano e obviamente as pesquisas em andamento pelo mundo, visam preferencialmente o uso rural. As pragas das lavouras são muito mais numerosas (em gêneros e espécies) do que as pragas sinantrópicas e apresentam, com freqüência, adaptações e mutações que exigem muita pesquisa para que logremos controlá-las.
No mercado agropecuário, há ao menos três novos inseticidas já lançados ou em via de lançamento, introduzidos por gigantes do setor. Esses novos compostos incluem seletividades aumentadas contra insetos daninhos, refletindo baixa toxicidade para outras espécies, e altas eficácias, possibilitando aplicações em concentrações mais baixas e mais espaçadas. A mais significativa das novidades é o espinetoramo o mais recente membro da família das espinosinas, descobertas e desenvolvidas ao longo da década de 80; o nome comum desse novo composto é espinosade em português. A origem teria sido uma amostra de terra coletada do solo de uma destilaria de rum abandonada, localizada numa ilha não identificada do Caribe por um químico da Dow AgroScience em férias. Do material recolhido, isolou-se um fungo actinomiceto, então denominado Saccharopolyspora spinosa, cujo caldo de cultura rendeu extratos que demonstraram atividade contra larvas da mariposa Spodoptera eridana. Uma versão de uso veterinário do espinosade, para controle de pulgas em cães, está em fase de licenciamento no Brasil, possivelmente sob o nome Confortis, por iniciativa da Elanco, divisão da Eli Lilly. A indústria farmacêutica detém direitos sobre o produto pelo fato de a Dow AgroScience, que agora pertence exclusivamente à Dow Chemical, ter sido fundada na forma de joint venture entre esta e a Lilly, em 1989. As espinosinas diferenciam-se de outros pesticidas com ascendências naturais, como neonicotinóides (bloqueio da atividade nicotínica no sistema nervoso central), avermectinas (bloqueio de canais de cloro) e piretróides (bloqueio de canais de sódio) pelo mecanismo de ação que estimula o receptor colinérgico nicotínico, cuja ativação inicia uma sequência de eventos acarretando a morte de insetos. O defensivo mostrou atividade contra insetos das ordens Lepidoptera, Diptera, Thysanoptera, cupins (Isoptera), formigas (Hymenoptera) e alguns coleópteros (besouros). O espinosade é um biocida de ação relativamente rápida, o inseto morrendo dentro de um ou dois dias depois de ingerir o composto, cuja taxa de mortalidade aproxima-se de 100%.
Outra gigante do setor, a Bayer CropScience, já está tirando do forno um novo composto, o espirotetramato , em testes desde 2007, a partir de sua estreia na Tunísia. Descendendo de dois derivados de ácido tetrônico, (espirodiclofeno e espiromesifeno), o novo defensivo mostra-se letal para insetos sugadores em plantas, a exemplo do pulgão Aphis gossipii e da mosca branca, Bemisia tabaci, que assolam culturas de algodão. Ainda não há notícias sobre seus possíveis usos contra pragas urbanas.
Já a BASF PlantScience, por sua vez, está em fase avançada de registro em muitos países, de sua nova molécula, a metaflumizona, a qual parece ser o defensivo em estágio de licenciamento mais adiantado, tendo emprego autorizado em países europeus como Alemanha e Áustria. Estruturalmente é uma semicarbazona cujo ativo exerce um ação que envolve o bloqueio de canais de sódio dependentes de voltagem nos insetos, decorrendo uma paralisia relaxada, de forma semelhante à produzida pelo inseticida oxadiazínico indoxacarb, com o qual apresenta semelhança estrutural. Enquadrado entre os inseticidas “verdes”, em razão da sua baixa toxicidade (DL50 = 5.000 mg/kg), o novo produto apresenta vocação antiectoparasitária, sendo comercializado em formulações veterinárias para controle de longo prazo de pulgas, ácaros e carrapatos.
Salvo erro ou omissão, esse é o quadro momentâneo, mas vou ver se descubro mais alguma coisa por aí, certo Hipólito?

sábado, 15 de outubro de 2011

UM POUCO SOBRE A FORMIGA SAÚVA (Atta capiguara)


Nossa amiga e leitora Ivone nos indaga sobre o controle da formiga saúva (Atta capiguara) e seu controle em âmbito urbano. Vamos, então, passar uma rápida vista sobre esse tema.
A saúva é uma séria praga tipicamente rural que traz grandes dores de cabeça ao agricultor, pois sua ação pode ser literalmente devastadora. Ainda que seja rural, a formiga saúva está presente também no meio urbano infestando jardins tanto públicos, quanto particulares, gramíneas, viveiros de mudas, áreas de reflorestamento, etc. Atacam quase todas as culturas, cortando folhas e brotos tenros, com extrema habilidade e rapidez. Sob o nome de formiga saúva, abriga-se um expressivo número de diferentes espécies de formigas, especialmente do gênero Atta (mais de 200 espécies), também conhecidas como formigas cortadeiras. Insetos tipicamente sociais, seus formigueiros são formados por várias câmaras, cada qual com um tipo de finalidade específica. A sociedade das saúvas é composta por várias castas. As saúvas cortam pedaços de folhas que carregam aos seus ninhos a fim de semear e cultivar fungos que constituem seu alimento exclusivo. Aliás, existem apenas duas espécies que plantam e colhem seu alimento: o homem e a formiga cortadeira. Recebem incontáveis nomes regionais em nosso país, além de saúva: formiga cabeçuda, carregadeira, manhuara, maniuara, picadeira, roçadeira, caiapó, lavradeira, etc. As folhas e outras partes de plantas são levadas ao formigueiro para servirem de substrato para o cultivo do fungo mutualista do qual as formigas se alimentam (Leucoagaris gongylophorus, este é o nome mais aceito atualmente). A saúva rainha é conhecida com o nome de içá (ou tanajura) e os machos são os bitus (ou sabitus); em certos dias claros do começo da estação chuvosa, a geração de saúvas criada para serem reis e rainhas, já alados, inicia sua revoada (conhecida como siriris ou aleluias) para a formação dos pares. As rainhas levam em suas bocas, uma bolota do fungo essencial colhida no formigueiro natal, são fecundadas e de volta ao solo busca um ponto apropriado para instalar um novo formigueiro; regurgitam a bolota de fungo e irriga-o com sua matéria fecal. Para nossa sorte, cerca de 100% das içás não chegam a formar sauveiros maduros. Durante o vôo são presas de pardais, andorinhas e sabiás; no sauveiro novo, são atacadas por tatus e outros predadores. Tanajuras fazem parte do cardápio alimentar dos índios brasileiros (fritas em salmouras e misturadas com farofas), de sertanejos e tropeiros. Mas, se você for ao mercado público de São José em Recife/PE, por exemplo, poderá adquirir a peso, içás já secos e prontos para ir à panela.
Justificando seu nome de cortadeiras, as saúvas podem, literalmente, desfolhar uma árvore inteira no espaço de apenas uma noite. As folhas cortadas e forrando o chão ao redor da árvore atacada, são então, durante o dia, picadas e transportadas para o formigueiro por milhares e milhares de carregadeiras incansáveis em filas indianas intermináveis, ladeadas por soldados ameaçadores que, com sua grande cabeça e poderosas mandíbulas em forma de pinças, garantem a segurança das carregadeiras, ao tempo que incentivam as mais morosas a acelerarem o passo. Certa vez, em uma granja avícola que cultivava um eucaliptal (lá, o eucalipto é picado em forma de maravalha, para servir de cama para os frangos e matrizes), observei logo pela manhã, um pé de eucalipto inteiramente nu, com todas suas folhas no solo formando um grande monturo em torno do tronco; ali, intensa atividade das saúvas encarregadas de picar as folhas em tamanhos menores e as carregadeiras indo em direção ao formigueiro levando cada qual um pedaço de folha. Às vezes esse pedaço era tão grande e pesado que eram necessárias duas ou mais formigas para carregá-lo. Voltando do formigueiro pela mesma trilha, outra interminável fila de carregadeiras de mãos abanando (ou seria mandíbulas vazias?). Acompanhei essa trilha operosa até o formigueiro que se situava a cerca de 500 ou 700 m de distância até ver as formigas desaparecerem no solo através de um orifício (o chamado “olho ou olheiro” do sauveiro) situado em um monturo de terra endurecida. Lembrei-me daquelas inesquecíveis imagens da Serra Pelada na década de 60, onde milhares de homens, enlameados até o pescoço, carregavam em fila indiana ungidos por cabrestos invisíveis, sacas de terra dentro de enormes crateras sob os olhos atentos do Major Curió, em busca de ouro.
Mas, voltando ao tema, a questão é como controlar as saúvas. Há décadas o Brasil (e outros países que sofrem do mesmo mal) tenta combater a saúva devido aos danos enormes às lavouras. Um método muito difundido é a aração do sauveiro, com resultados quase sempre medíocres, pois as saúvas refazem seus formigueiros com certa rapidez. Nunca presenciei, mas há outro método simples usado na zona rural: ligar com uma mangueira o cano de descarga de um trator, conectar essa mangueira ao olheiro do formigueiro, regular o motor para mistura rica e preencher a rede de túneis como CO (monóxido de Carbono); supostamente os túneis serão preenchidos pelo gás que é letal e eliminaria todas as formigas ali existentes naquele momento, incluindo a rainha. Outro método é a inundação das panelas subterrâneas com muita água, frequentemente com adição de algum inseticida pó molhável (o objetivo final é o de eliminar a rainha, sem o que não há a menor chance de sucesso). Foi o método que preconizei naquele caso citado acima usando um piretróide pó molhável na concentração de calda de 0,025% (nesse método, é preciso atenção ao biocida a ser empregado, tem que ser PM, para que evitemos contaminar em demasia o solo). Para preencher os subterrâneos de um só cupinzeiro, foram necessários nada menos que 1.300 litros de calda introduzida a partir de um tanque puxado a trator e dotado de bomba de pressão; é preciso calcular também o custo benefício. Eu poderia ter empregado um termonebulizador, mas naquela propriedade não havia nenhum disponível naquele momento. Na zona rural já existe um produto (chamado de “fumacê”) a base de cipermetrina, um fumígeno que, ao que apregoa seu fabricante, produz 100% de eliminação do sauveiro; há notícias que uma versão domissanitária estaria em vias de registro na Anvisa. Hoje, a tendência é o uso de iscas que, atraindo as saúvas passantes, são colhidas e transportadas até o sauveiro; os principais ingredientes ativos dessas iscas são sulfluramida e fluazuron. Ao que parece, não se deve tocar essas iscas diretamente com as mãos, pois as formigas deixariam de colhê-las. E nem colocá-las nas trilhas, mas ao lado delas. Sim, a maioria dessas iscas é constituída de bagaço de laranja.

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

FINALMENTE UM ROTEIRO PARA O POP DAS EMPRESAS CONTROLADORAS


Custou, mas conseguimos. Tenho sido bombardeado para escrever um post sobre o tal do POP – Procedimento Operacional Padronizado – um documento formal exigido pela RDC 52, a Portaria que rege as atividades das empresas controladoras de pragas em nosso país (até segunda ordem). Fui pesquisar esse tema e achei que deveria solicitar o auxílio de uma especialista, a bióloga Lucy Ramos Figueiredo, Diretora Técnica da ABCVP, que tem larga experiência no assunto. Depois de muito insistir, ela conseguiu encaixar entre seus 4.812,5 afazeres, um tempo para escrever um post exclusivo para o Higiene Atual, pelo que agradecemos em nome de nossos leitores e deste Editor. Aí vai, portanto, um ótimo post sobre o POP.

DIZEM QUE O PAPA É pop ... MAS O QUE É UM POP???
O papa é pop. Assim dizia uma letra de música, referindo-se a um papa popular. Daí, ouvimos algumas pessoas perguntando o que é um POP. Outro assunto! POP, pop, muita confusão, muita informação... Então, vamos esclarecer?
POP é uma abreviação para Procedimento Operacional Padronizado.
PROCEDIMENTO- modo de fazer, técnica
OPERACIONAL- que contribui para a obtenção de um resultado pretendido, método
PADRONIZADO- resultado com tendência à uniformização

O POP é um documento exigido pela RDC 52, por meio do qual as empresas de controle de pragas sinantrópicas devem apresentar os procedimentos realizados para realização dos serviços prestados. É necessário lembrar que o serviço não envolve tão somente a parte executiva. Assim, temos um vasto conjunto de POP’s que compõem um Manual de Boas Práticas, o qual descreve os diferentes procedimentos adotados pela empresa e que se relacionam, direta ou indiretamente, com a execução propriamente dita. Os POP’s englobam “o modo de fazer” para vários temas: controle por praga, controle por técnica de aplicação, gerenciamento de risco, uso de armadilha para monitoramento por praga, segurança de trabalho, perfil das instalações, guarda e descarte de embalagens vazias, transporte de produtos químicos e por aí em diante, ou seja, todo e qualquer procedimento executado por uma empresa prestadora de serviços de controle de pragas deve ser documentado em forma de uma instrução técnica, detalhada passo a passo, visando dar suporte a todo e qualquer executor da tarefa a seguir “o mesmo caminho”. O POP deve ser claro, objetivo, assertivo, ter instruções sequenciais, sem deixar de conter a instrução completa. A grosso modo, o POP é uma receita de bolo a ser adotada para que não haja desvio significativo nos procedimentos, evitando não conformidades. O POP, como ferramenta de segurança, deve garantir a não ocorrência de variações indesejáveis no resultado final, podendo gerar riscos. Tendo como comparativo a referida receita de bolo, esta tem como objetivo dar a base de procedimento para que um bolo tenha sempre o mesmo resultado, seja elaborado por A, B ou C. Assim como na feitura do bolo, ocorrerão desvios aceitáveis por conta de uma eficiência maior ou menor (por conta de um forno, no caso do bolo) ou por conta de um equipamento mais novo ou mais antigo, no caso de uma pulverização. Ainda que estes desvios devam ser minimizados por medidas mitigadoras, podem efetivamente ocorrer, mas dentro de níveis toleráveis. Assim, um POP tem como meta a padronização de cada procedimento, sendo um material de conteúdo a ser utilizado para o treinamento de equipes técnico-operacionais ou gerenciais.
A elaboração de um POP, em forma de uma instrução de consulta e treinamento, é de responsabilidade dos RTs - Responsáveis Técnicos. A confecção de POP’s é trabalhosa e o RT precisa disponibilizar uma carga horária diária específica para a produção e finalização da tarefa. Um POP deve ser atualizado, minimamente, a cada ano, mas o ideal seria atualizar sempre que um procedimento for alterado, incluído ou excluído, por força da evolução dos conhecimentos. O POP representa o backup escrito das ações da empresa. É um processo dinâmico, que exige o envolvimento e o conhecimento da empresa por quem o elabora. Reforçando, o RT é a pessoa legalmente responsável pela feitura, atualização, verificação e monitoramento aplicação dos POP’s. Em caso de contratação de um consultor externo para confecção de POP’s, este deve estar informado sobre os procedimentos da empresa, acompanhando execuções, visitando instalações, enfim, conhecendo a rotina detalhada para ser fiel aos procedimentos adotados pela mesma ( “passeio ambiental”, segundo Lucia Isabel Araújo ). O POP, como ferramenta de treinamento, é um documento-guia que tem como alvo a passagem de informação, a rigor, da mesma informação para toda a equipe. Um POP não pode ser copiado, como alguns supõem, pois são criados mediante uma realidade executiva de cada prestadora de serviço de controle de pragas sinantrópicas. Os processos de certificação e auditorias têm como exigência a apresentação destes documentos, associando o que está escrito com a prática. O POP, como ferramenta de rastreabilidade, deve ser checado pela fiscalização para ver se o que está no papel é o que realmente ocorre na empresa.
Segundo as RDC 275 e a RDC 216:
Os POP’s referentes ao Manejo Integrado de Pragas devem contemplar as medidas preventivas e corretivas destinadas a impedir a atração, o abrigo, o acesso e a proliferação de vetores e pragas urbanas. No caso de adoção de controle químico, o estabelecimento deve apresentar Comprovante de Execução de Serviço fornecido pela empresa especializada contratada, contendo as informações estabelecidas em legislação sanitária/ambiental específica.
Então? Esperamos ter contribuído e ter tornado o tema POP um pouco mais pop, quer dizer, um pouco mais popular e acessível a todos aqueles que desejam, acertadamente, elaborar estes documentos de grande valia para as empresas.
Faça seu POP como uma receita muito especial, que será suporte e referência para os funcionários de sua empresa. Cada empresa tem sua política, suas técnicas e seus procedimentos. Retrate estas características de forma simples e fiel. Padronização significa QUALIDADE, mas com atendimento aos desejos dos clientes. A racionalização de tarefas aumenta a eficiência operacional, ou seja, tem um potencial de impacto nos lucros. Anexar FISPQ, Fichas de emergência, Fichas técnicas, Manuais de equipamentos e outros que auxiliem na operação e gestão agrega valor aos POP’s. Referências bibliográficas são parte integrante dos POP’s.
Escrever POP é buscar a qualidade através da capacitação. E qualidade não é um estado, é um processo.
Autora: Lucy Ramos Figueiredo

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

26 DE SETEMBRO: DIA DO PROFISSIONAL CONTROLADOR DE PRAGAS


Pela segunda vez neste blog, comemoro o dia do profissional controlador de pragas. Fiz um belo almoço comemorativo (mini paella valenciana) e abri uma garrafa de meu vinho italiano preferido atualmente (Malvazia Nera, safra 2008). Enquanto isso, outra vez rememorei passagens interessantes de minha vida profissional, incluindo um hilário encontro de um de meus operadores (sim, eu tive uma empresa controladora há tempos atrás) com um solerte esqueleto armado em pé, aguardando uma palestra médica que iria acontecer na manhã seguinte. Era um congresso médico em um dos hotéis atendidos por minha empresa e, tarde da noite, meus três operadores que estavam executando o tratamento, decidiram se dividir para cobrir todas as áreas. Um para cada andar e coube ao Geraldinho (aquele mineirinho que era especialista em inventar novos vocábulos da língua portuguesa, tais como "desimpossível") tratar as salas de conferências todas já preparadas e prontas para receber os palestrantes. Em uma sala, sobre a mesa, uma réplica de um coração em ponto grande; Geraldinho entrou na sala, olhou a peça e me chamou perguntando o que era aquilo. Expliquei, ele ficou admirado e comentou que ao ver a peça, pensou que deveria ser o coração de uma avestruz, pois notara a semelhança com coração de galinha que ele saboreava nos churrascos da vida. Achei inteligente e decidi acompanhá-lo nas demais salas, pois certamente haveria outras surpresas e situações, era só uma questão de tempo. Contando com isso, chamei os outros dois operadores e formamos um grupo de espectadores acompanhantes, enquanto Geraldinho seguia em frente abrindo e entrando em novas salas. Na sala seguinte, sobre a mesa, uma grande réplica plástica de um olho humano com todas as estruturas expostas. Geraldinho ficou espantado e, enquanto trabalhava, não tirou o olho do olho, especialmente depois que um dos colegas disse brincando que esse olho movia-se acompanhando o movimento da pessoa que passasse em frente (um efeito ilusório que frequentemente parece existir em quadros pintados, quando o pintor coloca os olhos mirando bem em frente). Pelo sim e pelo não, Geraldinho terminou rapidinho o tratamento daquela sala e saiu pressuroso. Sala seguinte, Geraldinho, deixado por nós propositalmente à frente do grupo, abriu a porta e acendeu a luz. Bem à sua frente, coisa de um ou dois metros, surge um esqueleto humano (de plástico) preso a um suporte e em posição ereta, com o crânio coincidentemente voltado para a porta. O susto que Geraldinho tomou foi tamanho, que o pulverizador que ele levava ao lado do corpo escorregou e caiu, enquanto ele literalmente pulava para uma distância que ele julgou segura, sob nossas gargalhadas. Pálido, ele nunca havia visto um esqueleto ao vivo e a cores, olhos esbugalhados, murmurava alguma coisa que nunca saberemos o que era. E quem disse que algum de nós conseguiu fazer com que ele retomasse o trabalho naquela sala? Nervoso, dizia que ali ele não entraria mais, pois ele não conseguia sequer imaginar o que iria ter na sala seguinte! Cena muito engraçada! Parabéns, Geraldinho e colegas, pelo seu dia de hoje, estejam onde estiverem!

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

A RATAZANA É FIEL À SUA VIZINHANÇA (Rattus norvegicus)


Um estudo publicado na revista Molecular Ecology e citado pelo Science Daily de 27/5/2009, nos conta que, embora as ratazanas (Rattus norvegicus) pareçam que andam sem destino pelas ruas, esgotos e terrenos baldios, na verdade elas são fiéis às suas vizinhanças onde passam a maior parte de suas vidas. Esse estudo foi feito na cidade de Baltimore compreendendo 11 áreas residenciais de onde foram capturadas 300 ratazanas as quais foram estudadas geneticamente para observar possíveis graus de parentesco entre elas. Vale dizer que a cidade de Baltimore nos últimos 50 anos tem conduzido caros programas de controle da população murina, mas o número de ratos aparentemente continua o mesmo, sem grandes mudanças. Os pesquisadores da Escola de Saúde Pública Johns Hopkins Bloomberg capturaram os espécimes para o estudo, nos dois lados do largo rio (Jones Falls) que corta a cidade em dois e em cada lado separaram duas comunidades de ratos de 11 quarteirões infestados cada; cada uma dessas áreas Cada comunidade foi então dividida em territórios equivalente a uma rua de área. Em cada território os ratos residentes foram examinados quanto a seu código genético para estudar possíveis parentescos. Os pesquisadores descobriram que essas ratazanas tipicamente permaneciam sempre próximas a seus territórios, raramente se aventurando fora de seu quarteirão, embora observassem que em caso de necessidade, algumas delas podiam percorrer quatro ou cinco quilômetros de distância para repovoar áreas abandonadas. Os estudos sugeriram que ratazanas embora raramente emigrem, os esforços de combate podem fracassar devido a essa tendência a repovoar áreas vazias, razão pela qual os pesquisadores recomendam maior abrangência geográfica das campanhas de controle dos roedores.

terça-feira, 20 de setembro de 2011

ÓRA ESSA! BARATAS PREFEREM DOBRAR À DIREITA!


Tem cada coisa sendo descoberta todos os dias! Um grupo de pesquisadores (todos muito sérios) da Universidade do Texas decidiu estudar a lateralização do cérebro de... baratas de esgoto (Periplaneta americana). Queriam saber se as baratas têm predominância de lado em seus cérebros, como os humanos. A lateralização é bastante estudada em vertebrados, mas poucos estudos existem em insetos. Os pesquisadores decidiram estudar o comportamento das baratas americanas em seu processo de decidir para que lado ir quando lhes é dada a opção de escolha. As baratas eram colocadas em um tubo de vidro em forma de Y e tinham que decidir para que lado ir, esquerda ou direita. Nas extremidades do tubo era colocado baunilha e etanol ao acaso, para atrair as baratas e as posições dessas substâncias eram constantemente trocadas de posição. Em seguida, uma das antenas das baratas (de forma alternada) era parcialmente amputada para verificar se isso influiria na decisão de caminhar para a esquerda ou para a direita (como sabemos, as antenas das baratas são responsáveis pelos sentidos do olfato e do tato). Uma simples análise estatística do ensaio mostrou que o etanol e a baunilha não interferiram significativamente na escolha de para qual lado a barata caminharia. O dano a uma das antenas de fato influiu na decisão da barata, mas quando ambas as antenas eram parcial e igualmente amputadas, houve uma clara tendência de optar por dobrar à direita. A conclusão que os pesquisadores chegaram é que a barata P. americana têm uma dominância à direita quando se trata de olfato e tato.
E o que é que isso nos ajuda, aos controladores de pragas. Sei lá, mas fico imaginando que se dispusermos iscas ou armadilhas colantes sempre no lado direito das quinas, quem sabe não aumenta nossa margem de sucesso em combater baratas de esgoto?

(post baseado e adaptado da revista Journal of Insect Behavior – Vol 24, Número 3, 175-185)

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

SOBRE OS PIOLHOS DE GALINHAS (Dermanyssus gallinae)


Recebo de um amigo e leitor, uma consulta sobre o piolho de galinhas (Dermanyssus gallinae) em ambiente urbano. Relata que deparou com um caso de alta infestação em galinhas criadas no quintal de uma residência e que estariam já invadindo até a casa do proprietário, criando uma situação bem séria. Então, vamos aproveitar a oportunidade para darmos um passeio (como sempre faço) sobre esse tema.
Piolho de galinhas, ácaro das galinhas, ácaro vermelho, piolhinho, bicho de galinha, carrapato de galinha e outros nomes populares e regionais deste país continente. Na avicultura industrial, torna-se uma temível praga que afeta fortemente a aves de postura, principalmente, porque espoliam a ave, sugam-lhe o sangue podendo levar à anemia, causam enorme stress com conseqüente queda na produção de ovos. De fato, no sistema de criação em gaiolas, a galinha poedeira mal consegue virar-se para poder remover com o bico os ácaros que se alojam em sua cloaca; há granjas que usam o sistema de colocar até duas poedeiras por gaiola, prática que impossibilita qualquer movimento que a ave possa executar para remover os ácaros de sua cloaca. Eu, particularmente, embora entenda a busca pela produtividade, abomino essa prática. Mas voltemos ao tema.
Duas espécies de ácaros se confundem sob o nome de ácaro vermelho das galinhas: o Demanyssus gallinae (prevalente) e o Ornythonissus bursa (menos frequente). Como ambos têm ciclos biológicos e ações daninhas muito parecidos, vamos nos ater ao mais comum que é o D.gallinae. O ácaro vermelho (assim chamado porque ao se alimentar fica ingurgitado com o sangue da pobre galinha) é um ectoparasita de galinhas e de outras aves (pombos, pardais, etc). Costumam passar o dia escondido em fendas e gretas das instalações onde as aves estão alojadas (onde cruzam e põem seus ovos) e à noite, buscam-nas para se alimentar. Em condições ideais, seu ciclo biológico pode se completar em apenas sete dias (adulto, ovo, larva, ninfas e adulto novamente). Embora precisem de uma ave para completar seu ciclo, os ácaros vermelhos podem infestar mamíferos incluindo os humanos, causando dermatites e lesões de pele. Além da espoliação, os ácaros vermelhos podem transmitir doenças às aves como a salmonelose e a espiroquetose aviária. O dermanissus pode sobreviver em um galpão vazio de aves, por até 10 meses.
O combate aos ácaros vermelhos passa pelo tratamento das aves, mas principalmente pela desinfestação das instalações. Claro que ideal seria tratar as instalações quando estivessem vazias, sem a presença das aves. Na avicultura industrial esse período se chama “vazio”, mas em uma criação doméstica, as galinhas estão sempre presentes, de forma que ao planejarmos o combate, temos que tratar as aves e as instalações ao mesmo tempo. Antes de tudo, é preciso ter em mente que as infestações por ácaros vermelhos são muito persistentes e um tratamento isolado dificilmente resolverá o problemas, tendo que ser repetido algumas vezes com intervalos relativamente curtos (máximo de um mês); todavia, não deve ser muito curto (mínimo de uma semana), pois as aves podem se intoxicar.
Se não estivermos lidando com cepas já resistentes a certos acaricidas, até que o tratamento é relativamente simples, uma vez que os ácaros são sensíveis à maioria dos biocidas. Bons piretróides, carbamatos (como o propoxur) e até organofosforados rápidos (como o DDVP), em dosagens leves, podem ser utilizados quando pulverizados ou polvilhados brevemente nas aves. Quando o número de galinhas é relativamente pequeno, pode-se executar o tratamento uma a uma, colocando o acaricida diretamente na cloaca por gotejamento ou polvilhamento (se o produto for um pó seco). Mas, como os ácaros concentram-se nas instalações e não nas aves, é ali que devemos priorizar a aplicação dos acaricidas. Frestas, reentrâncias, gretas, desvãos, além das próprias gaiolas (ou galinheiros) devem ser pulverizadas (ou polvilhadas) rigorosamente, incluindo as estruturas mais próximas que possam estar servindo de esconderijo diurno aos ácaros. Experimentei com muito sucesso um produto microencapsulado, certa vez, que sequer influiu na postura do plantel. Não esqueçamos que ninhos de aves silvestres nas proximidades do galinheiro, pinteiro ou galpão, devem ser removidos e evitados.

domingo, 4 de setembro de 2011

OUTRA VEZ FALANDO SOBRE PERCEVEJOS DE CAMA (BED BUGS)

A julgar pelos insistentes pedidos de informação que recebo sobre os percevejos de cama (Cimex lectularius), mundialmente conhecidos como Bed Bugs, esse problema deve estar acontecendo com grande freqüência e de forma preocupante, especialmente para os controladores profissionais de pragas a quem, em última análise, espera-se que saiba o que fazer. Vamos dar uma volta nesse tema evitando detalhes da biologia já abordados em post anterior.
Por volta dos anos 50, 60s e 70s, os percevejos atacavam rijo e eram considerados uma das principais pragas principalmente de hotéis, hospedaria, pensões e assemelhados em muitos países e regiões do globo. Já na década de 50 começou um intenso uso de DDT (seguido do uso sucedâneo do malation) para combater esses percevejos e os resultados foram ótimos. Esses compostos não só eliminavam as infestações, como davam um efeito residual que perdurava por muitos anos. O DDT, um inseticida clorado considerado o “pai” de todos os inseticidas modernos, foi apontado, na época, o “inseticida perfeito” para controlar os percevejos de cama. Porém, exatamente essa “qualidade” do DDT é que foi sua ruína, tal o volume de intoxicações agudas e crônicas que causava em pessoas que entravam em contato direto com esse poderoso inseticida, até que ele acabou sendo banido para uso urbano e finalmente também na lavoura. Além do que, o intenso uso do DDT de 1945 a 1955 no combate aos percevejos de cama, acabou por disparar o surgimento de percevejos resistentes, por sorte, sensíveis ao malation. Seja como for, essa praga praticamente desapareceu, ou era isso que se pensava. Nos últimos anos, contudo, os cimicídeos (nome que engloba todas as espécies de percevejos) retornaram e com força total. Nos Estados Unidos, por exemplo, mais de 30% dos hotéis e assemelhados encontram-se infestados por percevejos de cama, causando grandes prejuízos econômicos à rede hoteleira e riscos aos usuários. Um conhecido meu hospedou-se recentemente em um hotel quatro estrelas próximo ao centro de Nova York e lá ficou apenas por uma noite, tendo até sido trocado de quarto porque foi picado por vários percevejos. Essa praga também já chegou ao Brasil (eu particularmente suspeito que nunca tivesse ido embora) e está se disseminando com rapidez.
Como ocorre essa dispersão? Como um percevejo pode ir de um local a outro com facilidade? Na maioria das vezes, de forma passiva, sendo levados de um local a outro no interior de móveis, bagagens, caixas, roupas, etc. Eventualmente podem ser transportados por morcegos, pássaros e até roedores, seus hospedeiros naturais. De qualquer forma, fazem de hotéis e assemelhados, abrigos, complexos de apartamentos, dormitórios e congêneres seus habitats urbanos. Os percevejos têm clara preferência a se alojar próximo de suas fontes de alimento, ou seja, onde existam seres humanos, um suprimento precioso de sangue. Mas, se um incauto percevejo se meter a picar uma pessoa desperta, vai ser pronta e rapidamente esmagado com um solerte tapa da quase vítima. De forma que os espertos percevejos esperam que a pessoa durma para só então buscar sua próxima refeição. Picam à noite, quando estamos dormindo, os bandidinhos. Se a vítima tiver sono pesado, azar! Essa é a razão pela qual os percevejos se alojam preferencialmente nas dobras de colchões ou mesmo no seu interior, entrando por rasgos que possam ter. Alojam-se também na fendas e gretas das estruturas das camas ou dentro delas em camas tubulares de metal. Abrigam-se atrás de painéis e outras estruturas do quarto, embaixo de tapetes e outros locais onde possam se esconder durante o dia.
E daí? Como faço para combatê-los? Bem, não posso usar mais nenhum daqueles poderosos inseticidas clorados ou mesmo fosforados devido aos agora conhecidos riscos de intoxicação das pessoas que possam fazer uso das instalações tratadas. O combate aos percevejos hoje em dia envolve muitos fatores ambientais, tanto quanto o uso de algum biocida, se quisermos zerar a infestação em um dado local. O profissional controlador tem que ser metódico e detalhista, enquanto que o contratante tem que entender a extensão do problema, ser cooperativo e ter paciência até que os resultados finais apareçam. Quase nenhuma infestação será erradicada com apenas um tratamento isolado; essa meta poderá ser atingida, mas vai requerer uma série de tratamentos intervalados, além de mudanças ambientais (Manejo Integrado de Pragas - MIP lembram-se?)
Um guia passo a passo do controle de percevejos da cama (bedbugs) poderia ser, a grosso modo, assim delineado:
• Rigorosa inspeção das instalações infestadas incluindo áreas adjacentes de possível infestação. Ex: todos os quartos do mesmo andar onde se situa um quarto infestado em um hotel. Talvez até de andares próximos.
• Cuidadosa localização dos pontos onde os percevejos possam estar se abrigando.
• Detalhado planejamento do “modus operandi” no combate a ser executado. Lembre-se que um hotel, por exemplo, dependendo da época do ano, não pode manter muitos quartos interditados por longos períodos de tempo.
• Apresentar e discutir o planejamento com o contratante, procurando sempre explicar as razões biológicas que serviram de base para seu plano. Obter sua cooperação a qualquer custo.
• Implementar as ações de combate, de correção ambiental e de prevenção (estou novamente falando de MIP, certo?).
• Estabelecer um programa de monitoramento periódico para surpreender novas infestações ainda quando iniciais.
E como proceder para o tratamento com biocidas (eliminação das infestações já existentes)? Pelo menos por enquanto, há poucas notícias no mundo inteiro sobre o surgimento de linhagens de percevejos resistentes a certos grupos químicos dos biocidas, o que é um ponto a nosso favor. Como posso tratar?
• O ideal é o expurgo dos colchões, boxes e mobiliário infestados, fazendo uso do gases apropriados, como o brometo de metila. Não recomendo esse método para o profissional que não o domina, por ser de alto risco. Trata-se do emprego de um gás letal se inalado por seres humanos e, portanto, só com conhecimento de causa e medidas adequadas e apropriadas de segurança. Vai requerer uma câmara de expurgo ou uma envelopagem da pilha de colchões rigorosamente vedada com lençol plástico e exposição ao gás por 72 horas. Nada resiste a esse tipo de tratamento, mas, repito, é um procedimento técnico de grande risco e não vai ser nesse blog que o profissional controlador vai encontrar a metodologia operacional do expurgo.
• Não sendo ou não podendo expurgar, podemos pensar no uso de vapor de água para eliminar os adultos, as larvas e os ovos dos percevejos. Aplicar vapor com um desses equipamentos portáteis pode ser uma alternativa ecológica e eficaz, pois a temperatura do vapor atinge 100˚C que é letal para as diferentes formas do percevejo.
• Entre as medidas não químicas que poderão ajudar a erradicar infestações, podemos citar o uso apropriado de aspiradores de pó, a selagem dos colchões em sacos plásticos resistentes, o fechamento de gretas, pequenos desvãos e outros possíveis esconderijos dos percevejos.
• O emprego de biocidas deve ser fortemente considerado ao lado de medidas alternativas não químicas. Embora os percevejos de cama sejam sensíveis à maioria dos inseticidas, no mercado brasileiro não há muitos produtos que tenham no rótulo a indicação de uso contra essa praga. Em princípio porque as indústrias produtoras desses biocidas não estavam muito atentas para esse nicho de mercado e não se dedicaram a testar seus produtos contra os cimicídeos; consequentemente, não têm essa indicação nos rótulos. Dessa maneira, os profissionais controladores de pragas devem ser muito criteriosos na escolha dos biocidas que vão utilizar.
• A meu ver, formulações em pó, pós molháveis e microencapsuladas seriam as mais indicadas para o controle químico dos percevejos de cama, desde que correta e adequadamente aplicadas, sem expor os seres humanos a maiores riscos. Lembrem-se que uma pessoa vai passar pelo menos oito horas deitada em um colchão a cada noite.
O assunto é vasto e poderíamos abordar ainda muitos aspectos do tema, mas isto aqui é apenas um post. Quem sabe nossos leitores mais atentos possam ter tirado alguma informação útil desta nota. Quem sabe!

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

CHEGAMOS ÀS 30.000 VISITAS! É MOLE?

Caramba! E não é que já recebemos 30.000 visitantes no blog do Higiene Atual! Eu disse que só voltaria ao assunto quando chegássemos a essa marca, pois aqui estamos. A essa comemoração, quase não testemunho (esconjuro!) e por isso tem um sabor especial. Nosso contador “dedo duro”, aquele programinha que nos conta on line de onde estão acessando e em que momento isso ocorre (vide na coluna à esquerda), nos informa que o blog recebe visitantes dos mais diferentes Estados brasileiros e também do exterior; tudo muito às claras e com transparência para que ninguém duvide. Nosso programinha de mensagens curtas (interativo) continua recebendo manifestações e sugestões de temas de nossos leitores (coluna igualmente à esquerda da tela principal). Enfim, nosso blog continua atendendo aos objetivos para os quais foi criado: um canal aberto com profissionais controladores de pragas e interessados em temas similares. Que bom!
Grato a todos que nos têm visitado. Volto a comemorar só quando chegarmos a 40.000 visitas, OK?

domingo, 28 de agosto de 2011

QUANDO SE TRATA DE COMER, OS RATOS SEGUEM SEU OLFATO


Adoro o cheiro inebriante de um cafezinho sendo preparado, até mais que seu gosto. Será que se eu não sentisse cheiros os gostos seriam iguais ao que sinto hoje? Até que ponto o gosto depende do olfato? Essas perguntas estão sendo feitas pelo pesquisador Don Katz, um professor de psicologia e neurociência, e sua equipe, ao investigar um curioso comportamento de ratos. Segundo o professor Katz, os ratos escolhem o que preferem comer (quando há mais de uma opção) a partir do odor exalado pelo hálito de outros ratos. Isso é verdade mesmo quando os ratos são confrontados com gostos muito amargos como o cacau in natura, um alimento que usualmente não lhes interessa. Como os ratos são animais sociais, o experimento está sendo conduzido em condições de laboratório, mas os pesquisadores assumem que o mesmo comportamento ocorra em vida livre.
O experimento consiste em uma sessão chamada de “treinamento” e outra chamada de “teste”. Na primeira parte, um rato é colocado na presença de outro rato que acabara de comer certo alimento; o primeiro rato era então colocado frente a diferentes alimentos e ele sempre ia comer o que havia cheirado no hálito do segundo rato. Mas se após exposto ao hálito do que havia comido o alimento, o rato “cheirador” tinha seu senso de olfatar suprimido (através de uma pequena incisão no córtex cerebral isolando o centro primário do olfato), ele buscava qualquer alimento indistintamente. Todavia, quando o centro desativado era o do gosto, o rato seguia buscando aquele alimento que anteriormente havia sentido no hálito do rato que havia se alimentado.
O prof. Katz afirma que esses estudos ajudarão a compreender melhor a inter relação entre olfato e paladar no ser humano, já que uma série de intercorrências afetam o sentido do olfato em pessoas.
Enquanto isso, nós, os controladores de pragas, aprendemos um pouquinho mais sobre a neurofisiologia dos roedores, não é?

terça-feira, 23 de agosto de 2011

VOCÊ JÁ OUVIU FALAR DA BARATA SURINAMENSE (Pycnocelus surinamensis)?


Há alguns anos atrás, ainda no tempo em que o Higiene Atual era um periódico impresso (do qual fui o Editor) editado e distribuído por um laboratório produtor de biocidas onde trabalhei por muitos anos, a bióloga Lucy Ramos Figueiredo (atual Diretora Técnica da ABCVP), alertava sobre a entrada no Brasil de uma então nova espécie de barata, a Pycnocelus surinamensis, a barata surinamense. De lá para cá, ainda que nenhum estudo específico tenha sido efetuado em nosso país, escuta-se muitos relatos de profissionais controladores de pragas de diferentes regiões do país descrevendo, com dúvidas, a ocorrência de uma certa barata infestando caracteristicamente alguns clientes. Então vamos fazer um rápido resumo dessa barata, até para que os leitores possam identificá-la e combatê-la corretamente.
A barata surinamense é uma comedora de plantas e raízes que escava o solo para se esconder ou se mistura ao lixo na superfície. É capaz de atacar diferentes tipos de plantas no jardim e nos vasos ornamentais, entrando dessa forma no interior de residências e outros estabelecimentos. Embora não seja uma barata que possa ser considerada estritamente uma praga, a barata surinamense representa um incômodo nas dependências onde haja plantas ornamentais. Por não ser muito comum, frequentemente é confundida com a barata de esgoto (P.americana) ou mesmo com a barata oriental (B.orientalis). Essa espécie é de tamanho moderado (18 a 25 mm de comprimento), com asas que se estendem além do corpo; seu pronoto (a parte anterior do corpo) é escuro e as asas têm um tom ligeiramente esverdeado. Suas ootecas são guardadas pelas fêmeas dentro do corpo até o momento da eclosão (ela produz até três ootecas com aproximadamente 26 ovos em cada uma); as ninfas alcançam a maturidade em mais ou menos 140 dias e depois de adultas, vivem cerca de 307 dias.
Não se sabe muito ainda sobre a biologia da barata surinamense, mas há coisas interessantes a observar. Uma delas: até hoje nunca foi descoberto um macho nessa espécie, o que sugere fortemente que ela seja partenogenética, isto é, a fêmea reproduz-se sozinha, como ocorre nos escorpiões amarelos (Tytius serrulatus). Têm hábitos noturnos e dão extensos passeios antes de voltar a seus abrigos para passar o dia. Sabem quem a descreveu cientificamente? Carlos Lineu, aquele! Danado!
Felizmente são sensíveis a qualquer tipo de inseticida empregado usualmente contra baratas. Vasos com plantas ornamentais devem ser adequadamente tratados e lixo solto deve ser removido nos ambientes infestados pela barata surinamense.

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

OLHA SÓ: ANTIBIÓTICO NO COMBATE A CUPINS!


Há muitos cientistas pesquisando novos compostos e abordagens para o controle de pragas no mundo inteiro. Só isso já nos dá uma ideia de quão importante esse tema se tornou, mobilizando milhões de dólares por ano. Algumas dessas pesquisas não levam a lugar nenhum e nem chegam a ser divulgadas. Outras, todavia, parecem ser promissoras e ganham certo destaque na mídia e nos círculos técnicos.
A revista científica ScienceDaily, edição de 19 de julho último, trouxe uma nota muito interessante citando um trabalho veiculado pelo jornal Applied and Environmental Microbiology, edição também de julho/2011, 77 (13), de autoria dos pesquisadores R. B. Rosengaus, C. N. Zecher, K. F. Schultheis, R. M. Brucker e S. R. Bordenstein, cientistas da Universidade Northeastern de Boston, Massachussets.
Como sabemos, a flora bacteriana do trato digestivo dos cupins é absolutamente necessária tanto para processar a digestão da celulose, quanto para sua reprodução.
Aliás, essa flora dos cupins é sempre citada como o caso mais clássico de simbiose da Natureza (onde os dois seres tiram proveito mútuo). Pois bem, um grupo de cientistas pensou em estudar o que aconteceria se essa flora bacteriana fosse eliminada. Queriam saber se dando algum antibiótico aos cupins, algum que fosse eficaz na eliminação das bactérias existentes no trato digestivo dos cupins, o que ocorreria com esses cupins. Parece uma ideia interessante, não parece? Sugere que certas novas tecnologias possam advir dessa pesquisa para controlarmos insetos sociais como os cupins.
A Dra. Rebecca Rosengaus, porta voz do grupo, conta que a um grupo experimental de cupins (reis e rainhas), foi dado o antibiótico rifampina, enquanto a outro grupo, atuando como grupo testemunha, foi dado apenas madeira e água. O tratamento com o antibiótico reduziu em caráter permanente a diversidade das bactérias microbiontes do trato digestivo dos cupins. Embora a taxa de mortalidade nesse grupo fosse mais alta que no grupo testemunha, os pesquisadores não acham que isso se deu devido subnutrição ou mesmo desnutrição. O que observaram é que nos indivíduos sobreviventes, ocorreu queda na oviposição, o que resultou em retardo no crescimento da colônia e também redução do estado de saúde dessa colônia. “Esses resultados apontam para o potencial uso de antibióticos no controle de cupins e talvez outros insetos pragas, ao invés do emprego de compostos químicos agressivos ao ambiente”, diz a Dra Rosengaus. Ela ainda especula que a rifampina reduziu a fertilidade e a longevidade dos cupins tratados, ao desequilibrar a balança ideal das diferentes espécies de bactérias do trato digestivo que atuam na digestão da celulose, mas também na reprodução dos cupins. Ela ainda especula sobre o ainda desconhecido verdadeiro papel da flora digestiva de outra espécie social: os seres humanos!
Está aí, portanto, uma nova vertente de estudos e quem sabe, um dia, não venhamos a aplicar... antibiótico para controlar cupins!

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

QUEM É O PROFISSIONAL CONTROLADOR DE PRAGAS?



Certa vez, há muito tempo atrás, estou falando possivelmente cerca de 13 ou 15 milhões de anos atrás, um milhão a mais ou um milhão a menos, um grupo de humanóides, nossos antepassados primitivos, encontrou um temível tigre de dentes de sabre preso dentro de um buraco onde havia caído e donde não conseguia sair. O grupo exultava, pois ali estava um bocado de alimento disponível, bastando abater o poderoso animal. Lá no meio desse grupo, um tátara-tátara-arqui-avô nosso, não viu só isso. Ele viu uma maneira de capturar outro tigre ou outro animal que pudesse se transformar em alimento para o grupo. Tentando, errando, corrigindo, novamente tentando e ele finalmente conseguiu montar uma armadilha razoavelmente bem sucedida. Virou celebridade instantânea na tribo! Teria sido ele o precursor dos atuais profissionais controladores de pragas? Gosto de pensar que sim.
Vamos dar um extraordinário salto na história. Já é a primeira metade do século passado, o século XX. A civilização havia avançado incrivelmente, os conhecimentos, o saber, as cidades já haviam se organizado, as classes sociais se estratificaram, a evolução sócio/econômica/cultural havia progredido de maneira notável. As descobertas científicas aconteciam quase que diariamente e os jornais e revistas se encarregavam de divulgar os novos acontecimentos. Já havia o conceito de pragas mais ou menos estabelecido há alguns séculos. No campo, eram os animais (insetos ou mamíferos, em princípio) que atacavam as lavouras produtoras de alimentos e os depósitos de armazenagem após sua colheita. Nas cidades, eram todos os “bichos” que adentravam às nossas casas, armazéns, depósitos, estabelecimentos e indústrias e nos causavam toda sorte de problemas. O que não existia era um combate razoavelmente bem sucedido. Nessa altura, desde o século anterior, a sociedade começou a desejar que existisse um profissional capaz de aliviar a pressão das pragas em todos os sentidos. Obviamente não demorou muito para que surgisse um tipo de profissional que se dedicasse a esse nicho de mercado. Tendo adquirido alguns conhecimentos técnicos nos ainda poucos escritos da época e armado de artefatos, ervas e certos pós minerais ou orgânicos, lá ia nosso precursor se propondo a controlar pragas infestantes em diferentes tipos de locais. Tarefa ingrata, pois os resultados nunca eram satisfatórios. Na verdade, nosso amigo era em certas comunas, considerado um cidadão de segunda classe, posto que para exercer seu trabalho, tinha que se meter em esgotos, porões e outros locais onde a maioria das pessoas passava longe e torcia o nariz. E ele fazia o que podia usando as armas que dispunha; os inseticidas eram à base de infusões de tabaco, extratos de rotenona, certos compostos minerais como o tálio, o arsênico, o ácido bórico e outros compostos de risco e resultados duvidosos. Às vezes dava certo, às vezes não.
Já por volta de 40 a indústria química buscava compostos orgânicos sintéticos que fossem capazes de eliminar pragas da lavoura, uma vez que a demanda por alimentos havia crescido enormemente e grande parte das colheitas eram destruídas por determinadas pragas infestantes. Finalmente, em 1938, foi descoberto o famoso DDT que, na verdade, havia sido sintetizado 10 anos antes na Suíça, mas que ficara esquecido em alguma gaveta. Esse novo composto abria uma nova e incrível era no combate e controle das pragas na lavoura e, por extensão, nas cidades. Finalmente tornou-se possível praticar um controle efetivo e consistente. Na esteira do sucesso do DDT vieram outros inseticidas organoclorados como o BHC, o eldrin e o dieldrin. O profissional controlador de pragas ganhou um novo alento e, afinal, um status social alavancado pelo desejo crescente da sociedade em se livrar de certas pragas com as quais era obrigada a conviver até então. Naturalmente a lavoura agradeceu, a saúde pública agradeceu e o cidadão comum agradeceu. Vieram depois os organofosforados menos agressivos ao ambiente, os carbamatos, e os piretróides e os IDIs, sem esquecer os warfarínicos tão efetivos e eficazes no combate aos roedores. Ao mesmo tempo, os conhecimentos sobre os mais diferentes aspectos da biologia, bioquímica e o contexto das pragas nas biocenoses e ambientes, evoluíam de forma galopante.
E assim chegamos a nossos dias atuais. O profissional controlador de pragas passou a ter um papel exclusivo dentro do contexto social. O que temos hoje em todo o mundo? Empresas de todos os portes e tamanhos militando nessa especialidade profissional com grande sucesso comercial, algumas delas com base familiar e outras como negócio comercial, formando uma verdadeira indústria potencialmente geradora de milhões de dólares e dando empregos a um incontável número de profissionais de diferentes tipos. Quem é afinal, o profissional controlador de pragas? É apenas o operador que coloca um equipamento às costas e sai aplicando certos compostos químicos para onde é chamado? Negativo! É também o atendente telefônico que passa oito horas por dia recebendo os chamados e lidando com a clientela e é seu colega que organiza os chamados e prepara os roteiros das equipes. É o chefe da equipe de campo que a acompanha preparando tudo para que o tratamento possa surtir resultados. É o Responsável Técnico sempre preocupado com as operações e buscando novos conhecimentos. É a secretária e demais componentes da equipe administrativa da empresa. É o atarefado comprador, o contador e o almoxarife. É o porteiro e a faxineira. E é também o gerente e até o próprio dono da empresa. Todos são profissionais controladores de pragas. Juntos, lutam diariamente para manter seus negócios, mas ao mesmo tempo propiciando uma melhor qualidade de vida para sua clientela ao criar ambientes de moradia ou de trabalho livres de pragas ou com seus níveis sob controle. Preservam a saúde do ser humano, melhoram o bem estar das pessoas.
E olhem, se precisarem adentrar a uma rede de esgotos ou algum porão escuro, o fazem sem medo, pois o conhecimento técnico e especializado que adquiriram, os protegem!

quinta-feira, 30 de junho de 2011

O CHEIRO DO PERIGO

Os mecanismos dos comportamentos instintivos são misteriosos, como era até agora a simples reação de perceber e evadir-se de predadores que os camundongos apresentam, inclusive percebendo outras espécies perigosas que ele nunca havia encontrado anteriormente. David Ferrero e Stephen Liberles, ambos neurocientistas da Escola Médica de Harvard, descobriram um composto único encontrado em altas concentrações na urina de carnívoros, o qual dispara uma reação instintiva de repelência em camundongos e ratos fazendo com que eles protejam-se em fuga; os pesquisadores publicaram um interessante trabalho nos anais da Academia Nacional de Ciência (online) de junho 2011. Essa pesquisa havia começado em 2006 quando Liberles trabalhava com neurônios receptores de odores e identificou a que odor o TAAR4 respondia. Os camundongos têm cerca de 1.200 tipos diferentes de neurônios receptores de odores e 14 tipos de TAARs, razão pela qual seu olfato é tão apurado. Só para que avaliemos, a espécie humana tem cerca de 350 tipos de neurônios que identificam odores e aproximadamente cinco TAARS. Enquanto isso, no mesmo laboratório, David Ferrero, um estudante graduado, pesquisava que compostos naturais eram detectados pelos TAARs e descobriu que um deles era capaz de detectar o odor de diversos carnívoros(o TAAR4). A dupla juntou suas pesquisas e parece que eles haviam descoberto um “kairomônio”, um composto químico que funcionava como feromônio, exceto que era percebido por diferentes espécies ao invés de apenas entre membros de uma mesma espécie. Esse kairomônio é bastante volátil e assim, ratos e camundongos podiam senti-lo a grande distância, o que os colocava em alerta e disparava o mecanismo de fuga dependendo de sua intensidade. Para os roedores isso é “cheiro de perigo”. Ferrero identificou o composto contido na urina de predadores (2-feniletilamina) produzido pelo metabolismo dessas espécies, o qual dispara o mecanismo de fuga nos roedores. Em seguida ele estudou a urina de 38 espécies de mamíferos e descobriu que havia altos teores do 2-feniletilamina em 18 a 19 espécies, todos carnívoros; enquanto que a urina de mamíferos não predadores (como o coelho, a girafa e macacos) não continha esse composto. Os roedores testados para esse composto manifestavam alto poder de repelência aas urinas dos predadores e quando esse composto era retirado dessas urinas, os roedores deixavam de responder com fuga. Nós os humanos, não temos o gene que produz os neurônios TAAR4 e portanto, nada percebemos ao sentirmos o odor de carnívoros, mas temos o TAAR5 que registra reação de forte repugnância a certos odores.
A importância dessas pesquisas é grande e variada. Pode ser um começo para que desenvolvamos produtos capazes de realmente afugentar roedores de certa área. O tempo dirá.

Este post foi baseado e adaptado de revista online Science Daily de 28/06/2011

terça-feira, 28 de junho de 2011

TRATAMENTO DO RIO PINHEIROS CONTRA O MOSQUITO CULEX

Uma das responsabilidades do CCZ/SP – Centro de Controle de Zoonoses de São Paulo - é o monitoramento e controle dos criadouros de mosquitos em certos pontos do Rio Pinheiros, um rio poluído que atravessa parcialmente a cidade de São Paulo e deságua no também poluído Rio Tietê. Próximo a esse deságue o Rio Pinheiros executa uma curva que torna suas águas naturalmente mais lentas; essa condição somada a outras bem peculiares, faz com que ali se mantenham criadouros permanentes de mosquitos, notadamente o Culex quinquefasciatus, causando sérios transtornos aos moradores da região. Há anos o combate químico vem sendo executado pelo CCZ com resultados variáveis. Neste ano os técnicos do CCZ planejaram experimentar uma nova técnica de combate: aspersão aérea de Bacillus sphoericus em formulação granulada sobre os conhecidos focos naquele Rio (vide post anterior sobre esse assunto). Questões técnicas ligadas à permissão do vôo do helicóptero que aplicaria o produto retardaram a operação, mas ela acabou, finalmente, acontecendo. O biólogo Carlos Madeira que lidera a equipe responsável por esse ensaio, nos conta que inicialmente estava previsto o tratamento de uma área de 11,4 ha, mas por razões de segurança do vôo (a referida área fica relativamente próxima ao aeroporto de Congonhas, é rota de pouso de aviões e há pontes cruzando o rio com trânsito intenso de autos), a área teste foi diminuída para 8,6 há. Para garantir a segurança dos veículos passantes nas pontes, um trecho delimitado em 100 m antes de depois de cada ponte não foi tratado. Pontos de monitoramento foram previamente escolhidos, para leituras antes e depois do tratamento. C onta-nos Carlos Madeira que no dia 17/6 testes de calibração do equipamento aplicador apontaram a dosagem de 40 kg/ha, com lançamento de 18,1 kg por minuto, enquanto o helicóptero voava a 30 m do solo a uma velocidade de 80 km/h. Com esses parâmetros, foram aplicados na área teste aproximadamente 400 kg do B.S. granulado.
Pode ser que o leitor menos avisado ache que esse tratamento seja algo simples e que já é de conhecimento e uso corriqueiro em outros países, pois às vezes essa prática é até divulgada em noticiários televisivos. Pois não é não! Todo um planejamento técnico minucioso precede à aplicação propriamente dita e as variáveis envolvidas são por demais complexas para que o teste tenha valor científico. Afinal, o que se pretende nesse tratamento em massa, é uma avaliação final sobre os resultados obtidos, servindo de base para a decisão de adotar ou não o método da aspersão aérea em um centro urbano densamente povoado como a metrópole São Paulo. Quem trabalha em um órgão público de controle de zoonoses e de certas pragas transmissoras, entende o valor que o ensaio tem. Esperamos que a equipe responsável nos informe sobre os resultados obtidos assim que possível, para que possamos divulgar aos leitores deste blog.
A foto acima mostra a área do ensaio demarcada e em vermelho, os pontos não aplicados. Parabéns pelo excelente trabalho moçada!