segunda-feira, 16 de abril de 2012

O “CAUSO” DO INSETICIDA AMARELO


É muita matéria técnica! Deixe-me aliviar um pouco e lhes contar mais um “causo” que me aconteceu durante minha vida profissional. Um dia, fui contratado por uma grande indústria produtora de biocidas de uso profissional, com a missão de recuperar sua fatia do mercado perdida devido à ação nefasta de uma empresa de auditoria que, anos antes, havia recomendado a descontinuidade dessa linha de produtos. Aos poucos fui me enfronhando no assunto e revisando produto a produto da linha antiga, enquanto estudava o “pipe line” da empresa para futuros lançamentos. Entre os produtos que julguei que deveriam ser recuperados, figurava um inseticida organofosforado de meia vida muito curta, mas de efeito fulminante formidável. Até aí, tudo bem. Preparamos o relançamento e o mercado o recebeu otimamente. Passado um pouco de tempo, comecei a registrar algumas queixas de clientes que observavam que havia variação da coloração amarela do produto, de lote para lote. Achavam que o inseticida ficava “mais fraco” quando a coloração amarelada esmaecia. O Departamento de Produção garantia que não e que o teor era exatamente 100% m/v independentemente da coloração do lote. Essa variação de cor se devia a condições inerentes da própria produção.
Mas, eu tinha um problema nas mãos e os clientes deveriam receber um pouco mais que uma simples explicação negativa. Pedi à Produção que procurasse resolver a questão tendo em vista a reação do mercado. Pouco depois eles vieram com a solução: juntaram um corante ao produto, de tal sorte que todos os lotes produzidos doravante iriam ter sempre a mesma cor final. Excelente solução, pensei. Não mais teria reclamações. E assim, o tal inseticida passou a ser produzido com a mesmo tom de amarelo.
Nem bem colocamos o novo produto no mercado, estourou a bomba. Uma empresa controladora de pragas usou o inseticida no apartamento de uma cliente classe A todo acarpetado em branco (na época usava-se muito isso). Na verdade a dona tinha fixação pelo branco e o apartamento inteiro era dessa cor; móveis, paredes, forrações, armários de fórmica, pisos frios, tetos, tudo impecavelmente branco. Até o gato da madame era branco (angorá, se estou lembrado). Era uma brancura só! A empresa controladora executou seu trabalho contra pulgas principalmente, mas também contra insetos rasteiros em geral. Dia seguinte, foi uma gritaria geral. O apartamento da Sra. White estava, literalmente, amarelo! O carpete imaculadamente branco parecia que havia sido trocado por outro, imaculadamente amarelo. As paredes estavam amarelas, os móveis de fórmica, amarelos e assim por diante. Vários tons de amarelo conforme o tipo de material onde a calda havia sido aplicada, mas tudo amarelo. A madame estava em crise histérica quando cheguei para constatar o problema, devidamente acompanhado pelos proprietários apavorados da desinsetizadora e pelo Gerente de Produção de minha empresa. Mil explicações técnicas surgiram e nada de amenizar a crise da infeliz e raivosa dona do apartamento. Houve um momento em que parecia que a crise da mulher estava passando e ela já não estava tão nervosa, mas daí... surgiu o famigerado gato angorá branco em cena. Com a barriga toda amarela. Daí não teve jeito.
Concluindo: através do seguro da empresa produtora, a Sra. White voltou a ter um apartamento imaculadamente branco, pois tudo, completamente tudo foi devidamente reposto. O seguro cobriu até um banho antiamarelo do gato. E o lote amarelo do inseticida que já estava no mercado foi discretamente recolhido e trocado por um lote sem corante. Recall completo!
Que sufoco! Coisas e “causos” da vida.

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