quarta-feira, 8 de junho de 2011

O IMPACTO AMBIENTAL DE UMA SIMPLES LÂMPADA DE RUA


Um dia desses, estava eu calmamente sentado na varanda de minha casa no final do dia, começo da noite, lendo gostosamente um bom livro sobre Mitologia greco-romana (tema que sempre me interessou). Gosto muito desse momento que divide o dia da noite, porque as cores se intensificam e a Natureza nunca me negou um espetáculo diferente todos os dias. Era início de outono com os dias ainda bem quentes e noites tépidas. Minha auxiliar (a quem dou um valor inestimável) interrompeu minha leitura com um gostoso cafezinho feito na hora, de presença denunciada pelo aroma provocador. Depositei o livro sobre a mesinha ao lado e, devagar, comecei a saborear o delicioso cafezinho enquanto minha mente vagava livremente entre o labirinto de Dédalo, as tintas fortes do por do sol (vocês já repararam que o por do sol no outono e inverno fica particularmente colorido?) e a luz do poste que fica bem em frente à minha casa, onde centenas de pequenas mariposas já iniciavam seu bailado mortal. Percebo, quase sem querer, que dezenas e dezenas dessas mariposinhas jê haviam caído ao chão, moribundas, enquanto outras tantas, como se não apercebendo do risco, voavam e círculos em torno do bulbo de sódio da lâmpada no poste. Minha cabeça passou a se concentrar nesse pequeno átomo que compunha o momento e me levantei para ver mais de perto o fenômeno. Não que eu nunca tivesse visto essas cenas, ao contrário, mas naquele dia e naquele instante comecei a conjecturar sobre as razões e os por quês desse fenômeno e suas consequências. Colhi com as mãos um ou dois exemplares dessa mariposinhas, dois que me pareceram robustos e fortes. Ambos estavam exaustos, mal conseguindo fibrilar suas asas. Imaginei quantos descendentes deixariam de ser gerados por aquele simples par de mariposas, simplesmente porque cederam a seus impulsos naturais e esvoaçaram por algum tempo em torno da falsa luz de um poste. No chão, ao redor do poste, havia pelo menos cem mariposas e outros insetos voadores de todos os tamanhos e espécies, mortos ou moribundos. Um pensamento leva a outro que leva a outro e decidi fazer uma pequena pesquisa sobre esse tema.
Descobri que dois terços da proteína animal consumida no mundo provêm dos insetos, de forma direta ou indireta. Estes formam a base da cadeia alimentar, da pirâmide predador-presa. Não pude deixar de imaginar que se por alguma razão essa base é erodida, toda a pirâmide tende a esboroar-se. Depois de alguns anos de janela, cheguei à conclusão que ser preservacionista não se trata de sair por aí abraçando árvores. Trata-se muito mais de atitude, de percepção do entorno, da valorização consciente da biocenose que compõe um dado ambiente que devem ser preservados, deixando um legado para nossos filhos e netos. Sem nenhuma pretensão de ser um especialista, comecei a imaginar qual seria o impacto de uma simples lâmpada elétrica teria sobre a fauna noturna de insetos e outros seres. Percebo de imediato que se por um lado essa lâmpada quebrando a escuridão da minha rua vai atrair centenas de insetos voadores e condená-los à morte prematura, por outro lado vai favorecer grandemente a um conjunto de predadores que vão se aproveitar do estado de desorientação e cansaço daquelas presas incautas; rãs e sapos sabem perfeitamente que se aproximando de um poste com lâmpada elétrica, é garantia de uma suculenta refeição sem maiores esforços. Nesse breve intervalo entre dia e noite, pequenos pássaros de rápido vôo caçam mariposas e outros insetos voadores atraídos pela luz, assim como fazem morcegos insetívoros. Certas formigas também se banqueteiam com cadáveres dos insetos voadores abatidos.
Na verdade, essas mariposas e outros insetos noturnos, trazem impresso em seu DNA a atração pela luz da lua quando vão parear-se e nada as confundem mais que uma lâmpada elétrica acesa. Atraídas pelas luzes, volteiam em torno em estado quase hipnótico e acabam se chocando com o vidro da lâmpada queimando seu corpo e ficando desabilitadas para o vôo, ou então acabam esgotando suas forças e caem ao solo tornado-se presas fáceis para animais de outras espécies. Na minha tosca pesquisa fui informado que os alemães já publicaram diversos trabalhos sobre esse tema, todos recheados de quadros estatísticos e análises gráficas.
Outro fim de tarde, voltei à minha leitura na varanda, mas sempre de olho na lâmpada do poste.

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