segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

UM DIA NA VIDA DE UM CAMUNDONGO (Mus musculus) – Parte I


A luz do dia começa a desaparecer e surgem as primeiras lâmpadas acesas. Com elas também surge um focinho cercado de longos bigodes cheirando nervosamente o ar, saindo cauteloso de um pequeno buraco na junção da parede com o chão. É um camundongo macho adulto, líder de uma família composta de algumas fêmeas e diversos filhotes em diferentes idades, vários ainda não desmamados, que esteve esperando horas por esse momento no vão oco da parede onde mora. Expondo somente a cabeça, ele fica estático por um segundo ou dois, cheirando nervosamente o ar ambiente em busca de odores que podem denunciar a presença de seus atávicos inimigos naturais, o cão e especialmente o gato. Será que existe algum perigo? Como todos os camundongos ele enxerga mal na escuridão, pois não dispõe, como os gatos, de visão noturna; seus olhos negros hipertireoideanos (globosos) vêem pouco, não muito longe na semiescuridão daqueles minutos onde a noite começa. Em compensação, esse formato globoso dos olhos lhe dá a condição de perceber qualquer coisa se movimentando na mais completa escuridão. Por isso, o camundongo tem que confiar mais em seus outros sentidos. Suas narinas trêmulas e seus ouvidos ampliados por orelhas em forma de concha acústica, lhe dizem: “tudo bem!”. E assim, o camundongo começa a percorrer o primeiro de vários circuitos idênticos que fará em seu conhecido território aquela noite. Ele visitará inúmeros pontos daquela área, a qual conhece tão bem, confiando muito mais em sua notável memória quinestésica (uma gravação subconsciente de uma série de movimentos musculares e deslocamentos em diferentes sentidos) do que em seus olhos, ouvidos e focinho. Vira à direita e corre 20 passos, pára e vira à esquerda em diagonal e corre 10 passos, sobe pela lateral cerca de 0,5 metro e chega ao saco de farinha de trigo que ele havia localizado uma semana antes. Come um pouquinho nervosamente e já se movimenta para buscar outra fonte de alimento, mesmo tendo uma saca inteira à sua disposição. Ele sabe que não deve ficar parado por muito tempo, pois é aí que mora o perigo, um gato pode estar esperando por ele exatamente nesse ponto e então... babau, já era um camundongo. Estimulado pelo ato alimentar, seu intestino funciona e ele rapidamente defeca algumas cíbalas. Vira o corpo novamente, anda cerca de 50 cm e encontra outro alimento; mordisca um pouco de aveia caída na prateleira através do orifício que roera na embalagem dias antes. Sai para a direita e anda 12 passos. Um momento! Onde está a caixa de sementes de girassol onde ele complementou sua refeição ontem mesmo? Afinal, ele precisa ingerir cerca de 5 g de alimento por noite.
Mudança de posição:- uma caixa que foi movida de lugar representa um verdadeira crise para o camundongo. Seu universo mudou! A vida ficou mais complicada para ele e nosso herói interrompe sua atividade normal. Na próxima hora ele vai reexplorar seu território, investigando qualquer objeto velho ou novo. Assim ele reestabelece suas rotas e reprograma a memória para seus movimentos musculares, de forma que novamente consiga deslocar-se livremente pela área de seu território, o qual na verdade não é grande: 3 m para cada lado e para o alto.
DICA PARA O CONTROLE:- a mudança de lugar dos objetos na área infestada por camundongos, ajuda a aumentar a eficácia de ratoeiras, armadilhas e das iscas raticidas, pois os camundongos irão investigar as mudanças ocorridas em seu território. Um sistema permanente de mudança ativa dos objetos e estoques pode auxiliar grandemente o combate a camundongos nos depósitos, armazéns e despensas.
Tudo inspecionado e memorizado novamente, nosso camundongo retorna à sua rotina de percurso do território e de alimentação. Mas, agora, ele não está mais sozinho. Na verdade, o camundongo raramente está só, simplesmente porque em matéria de reprodução o camundongo deixa o coelho envergonhado de seu desempenho. Atrás dele, surgem “as esposas”, sim porque ele mantém um harém e um bando de filhotes já desmamados que estão em fase de aprendizado; estão acompanhando suas mães as quais lhes ensinam certos fatos da vida! Os filhotes machos têm curta autorização para ficar nesse território, pois ao primeiro sinal de aproximação de sua maturidade sexual, o macho líder do harém (seu pai, por sinal) os expulsa na base da cacetada. Eles que se mudem para outra freguesia e que vão formar suas próprias famílias. Os filhotes fêmeas têm permissão do pai para seguir morando no mesmo território, onde vão se tornar novas esposas do pai ou podem abandoná-lo se assim o quiserem. Muito liberal esse sistema! O camundongo fêmea atinge sua maturidade sexual em torno de 30 ou 40 dias depois que nasceu, tem de 6 a 8 cios por ano e produz de 6 a 7 filhotes por ninhada, cerca de 19 dias depois de ter sido coberta pelo macho. Dois dias depois do parto ela já está entrando no cio novamente e poderá ficar prenhe mais uma vez. Pense só nisso: todos os seus filhos, netos, bisnetos e tataranetos podem ter filhos no mesmo ano! Se todos esses descendentes vivessem, o que não ocorre, pois a taxa de mortalidade pode ser alta na comunidade por diferentes fatores, um único casal de camundongos poderia, teoricamente, gerar até 5.000 descendentes em um só ano.
Um defensor agressivo:- vamos voltar ao nosso valente personagem. Enquanto percorria seu território, suas narinas detectam o odor de outro camundongo macho adulto. Ele o procura, já cheio de testosterona, e o localiza a meio metro de distância, percebendo de imediato que se trata de um forasteiro invasor. Usando todo o peso de seus 20 g, nosso valente camundongo atira-se fortemente contra o invasor e trava com ele uma violenta luta de agarrões, dentadas, recuos e investidas de ambas as partes. Os camundongos da vida real nada têm a ver com os tímidos e carinhosos camundongos dos desenhos animados que estamos acostumados a ver na TV. Na vida real eles são agressivos protetores de seu território e do seu status social na colônia. A família de um camundongo é constituída de um macho dominante, duas ou três fêmeas reprodutoras e um bando de filhos. Em caso de invasão do território da colônia, não raro as fêmeas também se envolvem diretamente na pancadaria e juntos, os adultos, botam o invasor para correr, ou morrer. Na verdade, o território de uma colônia de camundongos é surpreendentemente pequeno. Vai de seu ninho localizado no vão da parede, do qual sai por um discreto orifício que eles roeram, continua por não mais de 3 ou 4 metros de piso livre, sobe pelas prateleiras e passa por uma série de caixas e caixotes, algumas ripas e caibros até chegar de volta ao ninho. Como a maioria dos camundongos, nosso herói viaja no máximo 4 ou 5 metros de seu ninho; raramente encontramos um território de camundongos maior que 8 metros de diâmetro.
DICA PARA O CONTROLE:- No ponto em que você avistar um camundongo (ou lhe informarem onde foi observado) ou você observar evidências de sua presença (fezes, roeduras, etc), imagine uma meia esfera tridimensional de 3 metros de raio em todas as direções. Esse será o provável território da colônia infestante, área dentro da qual você deverá executar o combate. Portanto inspecione cuidadosamente essa área para saber onde colocar seus raticidas (ou artefatos de captura).
E o que mais sobre o dia de nosso herói camundongo? Bem... aguardem um próximo post de continuação dessa saga, OK?

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