domingo, 20 de março de 2011

SOBRE A MISTURA DE INSETICIDAS


Bruno, leitor deste blog, nos sugeriu aí na coluna de Perguntas&Respostas situada à esquerda desta área de temas, um post sobre o emprego de misturas de inseticidas. Essa prática no controle de pragas não tem nada de novo, nem na agricultura (onde é muito empregada) e nem no controle de pragas urbanas. Os profissionais controladores de pragas fazem uso há bastante tempo. Mas, há certos aspectos dessa técnica que merecem alguns comentários.
A mistura de inseticidas baseia-se na utilização de produtos com diferentes modos de ação e/ou grupos químicos. A mistura pode ser sinergista (quando o resultado final é melhor do que se usássemos separadamente os compostos que misturamos) ou pode ser antagonista (quando o resultado final é inferior de alguma forma ao que obteríamos utilizando de forma separada os compostos da mistura). Certamente, a não ser em algum caso muito especial e específico, ninguém buscaria uma mistura antagônica, ela acontece por acaso, por acidente ou mesmo por desinformação de quem a praticou. Por exemplo, pode acontecer de misturarmos dois compostos que quimicamente reajam entre si formando um terceiro composto ou um deles pode anular, total ou parcialmente, o efeito do outro. Já na mistura sinergista, ocorre o contrário, ou seja, o resultado final da mistura é potencializado em certas características dos componentes da calda. Por exemplo: misturo um inseticida de notório poder residual a um que tenha um bom efeito fulminante e/ou desalojante. Há certo tempo atrás, tornou-se frequente a mistura de tanque do DDVP (um organofosforado) com um piretróide qualquer; resultados inegavelmente bons, mas um tanto arriscados devido à alta toxicidade do diclorvos, de notório efeito fulminante/desalojante, ainda que compensado por uma vida média muito curta, desaparecendo em 24 a 48 horas. Aliás, esse tipo de mistura, um biocida de efeito imediato com outro de efeito residual, tem sido uma busca constante dos profissionais controladores de pragas.
Alguns parâmetros básicos devem ser observados na prática da mistura de inseticidas:
• Não se deve misturar formulações de diferentes tipos, por exemplo, um concentrado emulsionável com um pó molhável, porque suas características físico químicas são completamente diferentes, mesmo que o ingrediente ativo possa ser o mesmo.
• De nada adiantará a mistura de dois compostos do mesmo grupo químico, com as mesmas características e modos de ação. Portanto, essa prática tão comum de misturar o piretróide A com o piretróide B que vemos sendo praticada por aí, nada acrescenta ao resultado final. É ilusório pensarmos que certas características desse produto A vão complementar as do produto B só porque seus respectivos fabricantes anunciam coisas diferentes em suas propagandas.
• A mistura sinergista deve contemplar compostos de grupos químicos diferentes, primeiramente porque terão diferentes mecanismos de ação sobre os insetos, evitando-se assim a tão temida resistência e segundo porque, aí sim, as características de um podem complementar as do outro. Essa estratégia, a mistura de piretróides e compostos organofosforados, por exemplo, tem mostrado um forte efeito sinérgico, prolongando o período efetivo de controle de certos insetos. A mistura de inseticidas para o manejo da resistência da praga aos mesmos é baseada no princípio de que os indivíduos resistentes a um determinado produto serão controlados pelo outro componente da mistura e vice-versa.
• Mais recentemente, algumas misturas têm recebido aprovação da Anvisa e já foram lançados no mercado brasileiro, mas são misturas já de fábrica (e não as que praticamos no tanque de nossos pulverizadores). O que há de comum nesses novos inseticidas comerciais é que eles combinam um piretróide com um neonicotinóide (IDI), este, sabidamente de baixíssima toxicidade para seres humanos e mesmo animais).
• A compreensão do conceito de toxicidade de misturas e o desenvolvimento da capacidade para calcular quantitativamente a toxicidade adicionada de misturas de agentes químicos, podem ser ferramentas úteis para se determinar as vantagens e desvantagens do uso de misturas.
• A DL50 (a dose que mata 50% dos animais testados e que expressa a toxicidade de uma dada substância) da mistura, absolutamente não será igual à do produto menos tóxico ou igual à do mais tóxico e nem à somatória dos dois valores. Cada mistura terá sua própria DL50, às vezes, desconhecida (ainda não determinada). Portanto, cuidado.
• Aproximadamente 6 milhões de substâncias químicas sintéticas são conhecidas e 63 mil são de uso cotidiano, podendo ser encontradas no ambiente, sendo que 118 agentes químicos são considerados mundialmente como prioritários para efeito de controle. Com estes dados é fácil verificar a necessidade de desenvolver-se legislação e mecanismos formais para controlar e avaliar o risco para a saúde e para o meio ambiente em função da exposição individual e múltipla aos agentes químicos tóxicos.
• A mistura de tanque (praticada pelo profissional controlador no momento da aplicação) sempre foi uma prática de risco, especialmente quando ocorre um acidente intoxicativo. Nada desnorteia mais um médico socorrista do que receber um paciente intoxicado por uma mistura de inseticidas.
São esses os toques que eu pensei em lhes dar, falando sumariamente de misturas de inseticidas, atendendo ao Bruno, leitor deste blog.

Um comentário:

  1. Constâncio,
    Parabéns pelo post! Obrigado por atender minha solicitação!

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